A menos de dois meses das eleições, as intenções de voto para a candidata do MDB, a senadora Simone Tebet, estão estacionadas em torno de 2%.
A chapa tem formalmente o apoio do PSDB – partido da candidata a vice, senadora Mara Gabrilli -, além de Cidadania e Podemos. E o nome de Tebet foi defendido por grupo de economistas e empresários no manifesto “A melhor via para o Brasil”, divulgado em junho, em meio a disputas internas para definir uma candidatura da chamada terceira via.
Entre os que manifestaram apoio a ela estão Affonso Celso Pastore, Ana Carla Abrão, Armínio Fraga, Candido Bracher, Luis Stuhlberger, Pedro Passos, Walter Schalka, entre outros.
O suporte de nomes de peso, no entanto, não se traduziu em aumento dos votos para a senadora do Mato Grosso, que tem apoio também no agronegócio.
Embora as pesquisas apontem que a senadora não tem chance de vencer esta eleição presidencial, os cientistas políticos apontam que a candidatura de Simone Tebet configura um projeto de mais longo prazo para ela – que amplia seu espaço também dentro do partido -, e uma espécie de reafirmação do MDB no cenário nacional.
Nara Pavão, cientista política e professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), diz que se trata de “um símbolo importante”.
“Lançar um candidato, mesmo que não seja um candidato viável, é quase que uma declaração de que ´estamos aqui e essa é a cara do partido´. (…) Sustentar uma candidatura boa – que não decolou, mas que mostra que o MDB está ali – ajuda na reconstrução da marca do partido”, diz Pavão
“O MDB e o PSDB precisam sobreviver e precisam insistir em candidaturas. Isso é muito importante para esses partidos, historicamente grandes, e que sofreram muito com o saldo da Lava Jato – que foi muito mais negativo para eles do que foi, por exemplo, para o PT, que é um partido que se sustenta muito no eleitorado. Esses outros partidos não têm muitos partidários, pessoas que defendam e que faça com que esses partidos não morram. Então eles têm muito medo de perder visibilidade.”
Mas por que a candidatura de Tebet estacionou neste patamar? Os motivos, segundo cientistas políticos ouvidos pela BBC News Brasil, envolvem tanto questões específicas da candidatura de Tebet – o perfil de política tradicional e a demora para a definição de um nome do MDB e do PSDB -, quanto o contexto central desta eleição: a divisão dos eleitores entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL). A seguir, veja os principais pontos:
1. Perfil de política tradicional
Simone Tebet é, ao mesmo tempo, um nome pouco conhecido no Brasil e que representa o sistema político tradicional, segundo analistas e professores ouvidos pela reportagem.
“Embora Simone seja nova, seja mulher, ela ainda é representante do sistema político tradicional – filha de um ex-presidente do Senado (Ramez Tebet), de um partido tradicional, sempre foi política”, diz o cientista político Leonardo Barreto, diretor da consultoria Vector Research.
“Ela ainda representa uma candidatura tradicional – gestada dentro do próprio sistema político e não amparada em movimentos de massa. É claramente um movimento de elites políticas.”
A cientista social Esther Solano, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), diz que a candidata do MDB tem “muita bênção e apoio da classe alta, fundamentalmente de empresários, que veem nela uma candidata que vai levar adiante uma agenda liberal”.
“Mas por mais que ela seja escolhida de elites, ela sendo desconhecida para o povo, não tendo realmente um canal de comunicação com o povo – como Lula e até Bolsonaro -, esse apoio das elites não se reflete em votos.”
Nara Pavão diz que, embora muitos eleitores tenham manifestado desejo de idealmente ter uma “terceira via”, chegar a um perfil que agrada a muitos é uma questão mais desafiadora.
“Não querer um dos candidatos (Lula ou Bolsonaro) é uma coisa, concordar em qual será a cara da terceira via é outra história”, diz.
“Esse cenário teria sido um pouco diferente se tivesse chegado a algum candidato descolado do sistema político – já que é isso que as pessoas que querem uma terceira via desejam – um político novo, alguém muito carismático, que possa falar para as massas. Esse candidato não apareceu, ele não surgiu.”
2. Conflitos internos e demora para definição
A demora na definição de candidatos do que se convencionou chamar de terceira via – e as brigas dentro dos partidos nesse processo – deixou pouco tempo para trabalhar essas candidaturas, segundo os entrevistados.
“Quando você tem um cenário muito polarizado e no qual desde o começo as candidaturas que se propunham como de centro, ou terceira via, não se concretizaram de maneira rápida… Isso gera um ciclo vicioso – quanto mais elas demoram, mais elas se apresentam como inviáveis”, diz Pavão.
Barreto concorda: “O problema do timing foi importante – se você tivesse Simone Tebet estabelecida desde o ano passado, com trabalho de disseminação, suporte, talvez poderia ter algum impacto, mas ficou muito, muito em cima. E aí o volume do alto falante da Simone Tebet é baixinho.”
Esther Solano disse que as brigas internas foram uma dificuldade e que “deu a sensação de que a terceira via só pregava, na verdade, a união do país e o fim da polarização e do ódio no papel”.
Em julho, até o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) foi acionado e teve que responder uma ação apresentada por um filiado ao MDB de Alagoas – o presidente da Corte, Edson Fachin, negou pedido para cancelar convenção do MDB nacional marcada para confirmar a candidatura de Tebet.
3. ‘Batalha de titãs’
Pesquisas de intenção de voto mostram que são minoria os brasileiros que planejam votar em um candidato que não seja Lula ou Bolsonaro.
“Entre essas duas figuras, é muito difícil abrir caminho como outra possibilidade, porque são duas grandes potências de mobilização, tanto Lula como Bolsonaro. É difícil abrir uma brecha”, diz Esther Solano.
Leonardo Barreto diz que, diante dessa falta de espaço, “para que uma terceira via se viabilizasse, você provavelmente teria que ter uma crise em um dos dois polos”.
Segundo pesquisa Datafolha divulgada na quinta (18/8), Lula aparece na liderança, com 47% das intenções de voto, seguido por Bolsonaro, que tem 32%. Isso significa que, juntos, eles têm três a cada quatro intenções de votos.
Ciro Gomes (PDT) tem 7%, Simone Tebet (MDB) tem 2% e outros candidatos somam 1%. Brancos e nulos representam 6%. Não souberam responder ou não responderam somaram 2%. Os números são referentes ao cenário estimulado, em que os entrevistados recebem uma lista de candidatos.
Nara Pavão diz que “a terceira via foi se inviabilizando a despeito de, por exemplo, a gente ouvir muito as pessoas dizendo que gostariam de uma terceira via”. A principal razão, ela diz, é a polarização entre candidatos muito fortes – “uma batalha de titãs”.
A cientista política lembra que a disputa se dá entre um ex-presidente e o atual presidente, e que os eleitores, neste caso, votam com base no que eles já fizeram, e não em promessas. “Não tem muito espaço para coisas subjetivas, abstratas, propostas de governo”, diz.
4. ‘Voto útil’
“Nesse cenário de polarização, não é só o que eu desejo, em um plano ideal. É o que é possível de ser concretizado. A gente vê cada vez mais o centro se derretendo – quanto mais a gente se aproxima do pleito, mais as pessoas vão agindo estrategicamente. A tendência é essa daqui pra frente”, diz a professora da UFPE.
5. Regras da eleição
A legislação eleitoral também tem sua parte nessa equação, segundo Leonardo Barreto.
“A nova legislação eleitoral está exigindo dos partidos priorização das eleições para a Câmara, porque você vai ter uma cláusula de barreira mais alta e fim das coligações. Isso faz com que os partidos políticos priorizem essas eleições (de parlamentares) em detrimento das eleições majoritárias”, diz ele.
O Congresso elevou a cláusula de barreira (ou cláusula de desempenho), que é o mínimo de votos necessário para se ter acesso ao fundo partidário e ao horário gratuito de rádio e televisão) – em 2022, será de 2% dos votos válidos. Outra mudança foi o fim das coligações – substituída pelas federações partidárias, que são as uniões de dois ou mais partidos por pelo menos quatro anos.
Barreto também diz que um prazo maior para realização de campanha política “seria essencial” para candidatos pouco conhecidos. A duração da campanha eleitoral, que já foi de 90 dias, atualmente é de 45 dias. “Para quem chega agora, é quase impossível realmente se apresentar”, argumenta.
Este texto foi originalmente publicado em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-62561132
Fonte: bbc.com