Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, braço executivo da União Europeia (UE), vai se reunir com o presidente Luiz Inácio Lula Silva em Brasília na segunda-feira (12/06), na primeira parada de um giro pela América Latina que se insere na estratégia do bloco europeu para fortalecer seus laços com o continente em um momento de rápida reconfiguração da ordem mundial.
Após a visita ao Brasil, Von der Leyen também se reunirá com os presidentes da Argentina, Alberto Fernández, na terça-feira em Buenos Aires, do Chile, Gabriel Boric, na quarta-feira em Santiago, e do México, Andrés Manuel López Obrador, na quinta-feira na Cidade do México.
A viagem serve de preparativo para uma cúpula entre a UE e a Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), que será realizada em 17 e 18 de julho em Bruxelas.
A Celac foi criada em 2010, é composta por 33 países da região e recebeu um novo impulso neste ano com o retorno do Brasil, após o ex-presidente Jair Bolsonaro ter afastado o país do organismo internacional. A última cúpula presencial entre a Celac e a UE ocorreu em 2015.
Acordo com Mercosul
Uma das prioridades de Von der Leyen em Brasília será defender a aprovação do acordo de livre comércio entre a UE e o Mercosul, bloco composto por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Esse será o tema de uma palestra dela na Confederação Nacional da Indústria (CNI), na segunda-feira.
No momento, as negociações para a ratificação do acordo dependem da solução de dois pontos principais de discordância. Do lado da UE, há uma demanda para que os países do Mercosul assumam mais compromissos ambientais – o bloco europeu enviou uma carta ao bloco sobre o tema e aguarda uma resposta.
As novas demandas ambientais foram motivadas pelo aumento do desmatamento na Floresta Amazônica nos últimos anos e teriam o objetivo de convencer os países europeus céticos sobre o acordo, afirmou nesta semana à DW o embaixador da UE no Brasil, Ignacio Ybáñez. No entanto, também há grande oposição ao acordo por parte de agricultores franceses e irlandeses, que temem o aumento da importação de carne bovina para a Europa. Houve indicações de que o governo brasileiro interpretou essas demandas como uma imposição de exigências.
Por outro lado, Lula já afirmou que não aceita a disposição do acordo sobre compras governamentais, que autorizaria empresas europeias a participarem de licitações públicas nos países do Mercosul em condições de igualdade com as empresas locais. Segundo o brasileiro, isso prejudicaria as pequenas e médias empresas no Brasil.
A Espanha, que tem laços históricos com a América Latina, assume a presidência rotativa da UE em julho, o que é visto por defensores do acordo como uma chance para que ele seja finalizado.
Nova estratégia da UE para a região
Na quarta-feira, a Comissão Europeia lançou uma estratégia para renovar seus laços com a América Latina, que foi marginalizada pelo bloco nos últimos anos.
O chefe da diplomacia da UE, Josep Borrell, afirmou que, embora o bloco europeu e os 33 países da América Latina e Caribe tenham “uma história comum e valores compartilhados, essa parceria foi subestimada ou, até mesmo, negligenciada”. Ele destacou que as relações comerciais permanecem fortes, mas a cooperação política ficou pelo caminho.
Segundo Borrell, a UE nos últimos anos estava preocupada com migração e Brexit, mas a ascensão da China e a invasão da Ucrânia pela Rússia, que vêm reconfigurando a ordem mundial, reajustaram o foco do bloco para a América Latina.
Oxfam critica foco em comércio
Na avaliação de Hernan Saenz Cortes, da ONG Oxfam, o foco da UE apenas no comércio coloca em risco a abordagem da crescente desigualdade na região. “Nos últimos três anos, o 1% mais rico acumulou 21% da riqueza criada, enquanto 60%, ou seja, seis em cada dez latino-americanos, estão em situação de vulnerabilidade, que atinge principalmente mulheres e a população indígena e negra”.
De acordo com Cortes, em vez de apenas tentar competir com a crescente presença na China em áreas-chave de investimento como lítio, do qual a região produz 60% da oferta global, a UE deveria se questionar em como oferecer algo diferente. As possibilidades para isso incluem o apoio à sociedade civil ou suporte a políticas de dívidas progressivas em fóruns multinacionais, exemplifica o especialista.
“Se a UE realmente deseja aprofundar as relações com a América Latina, o bloco deve colocar as desigualdades no centro dessa agenda”, ressalta Cortes.
Fonte: dw.com