O Supremo Tribunal Federal (STF) encerrou julgamento, no último dia 3 de março, da Reclamação (RCL) 29303. Por unanimidade de votos, os ministros entenderam que todos os tribunais do país devem realizar, no prazo de 24 horas, audiência de custódia em todas as modalidades de prisão.
A audiência de custódia é um importante instrumento processual adotado por diversos países, inclusive o Brasil, como forma de garantir o direito fundamental à liberdade pessoal e de reduzir a superlotação dos presídios. Nessa audiência o juiz avalia se a prisão é realmente necessária e adequada, levando em consideração a situação concreta do detido e os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito.
Durante a audiência de custódia, o juiz pode avaliar questões como a legalidade da prisão, a necessidade da prisão preventiva, a possibilidade de aplicação de medidas cautelares alternativas à prisão, como o monitoramento eletrônico, e a eventual ocorrência de tortura ou maus-tratos durante a prisão.
A audiência de custódia é uma importante ferramenta para garantir a proteção dos direitos humanos dos detidos, especialmente em casos de prisões arbitrárias, violência policial ou discriminação. Além disso, a medida pode contribuir para reduzir a superlotação dos presídios, pois muitas vezes pessoas que não representam perigo à sociedade acabam sendo presas preventivamente por longos períodos.
Há muitos tratados internacionais de direitos humanos que tratam do tema. O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, ratificado pelo Brasil em 1992, por exemplo, prevê em seu artigo 9º a obrigação de assegurar que toda pessoa detida seja conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais, e que essa autoridade julgue a legalidade da prisão e ordene a libertação imediata caso a prisão seja ilegal.
Além disso, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos estabelece em seu artigo 7º a obrigação de assegurar a todas as pessoas privadas de liberdade o direito de serem conduzidas, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais, e o direito de serem julgadas em prazo razoável ou libertadas, sem prejuízo de que prossiga o processo.
Ademais, a audiência de custódia também é recomendada por diversos organismos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), como uma prática essencial para garantir a proteção dos direitos humanos.
Na legislação brasileira, a audiência de custódia foi introduzida, pela Lei nº 13. 257/2015, no Código de Processo Penal (CPP). Posteriormente, a Lei nº 13. 964, de 24 de dezembro de 2019, também conhecida como Pacote Anticrime, acrescentou dispositivos ao CPP para aprimorar a realização das audiências de custódia, como a previsão de que a autoridade policial responsável pela prisão apresente relatório circunstanciado sobre as condições da prisão e o estado de saúde do preso.
Portanto, um dos principais avanços da legislação brasileira foi a incorporação da audiência de custódia em relação a todas as pessoas detidas em flagrante delito ou por ordem judicial tenham o direito de serem apresentadas imediatamente ao juiz competente.
Porém, um dos grandes desafios para a implementação efetiva da audiência de custódia é a resistência de algumas autoridades e instituições do sistema de justiça criminal. Muitas vezes, a cultura punitivista e a falta de recursos para capacitação e treinamento dos agentes envolvidos acabam dificultando a efetivação dessa importante medida.
Outro desafio seria a questão da imparcialidade do juiz que determinou uma prisão preventiva para atuar em uma audiência de custódia. Há muitas comarcas no interior do país com apenas um juiz. Como esse magistrado poderia rever sua decisão?
Oxalá todos esses desafios sejam suplantados e as audiências de custódia sejam uma realidade em todo território nacional.
Marcelo Aith é advogado, latin legum magister (LL.M) em direito penal econômico pelo Instituto Brasileiro de Ensino e Pesquisa – IDP, especialista em Blanqueo de Capitales pela Universidade de Salamanca, mestrando em Direito Penal pela PUC-SP, e presidente da Comissão Estadual de Direito Penal Econômico da ABRACRIM-SP
Fonte: gazetadigital