SUS: 9 em cada 10 cidades têm menos de um psicólogo por mil habitantes

SUS:  9 em cada 10 cidades têm menos de um psicólogo por mil habitantes
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Baixo número de profissionais apurado em levantamento dificulta acesso a consultas

O Brasil tem cerca de 439 mil psicólogos, segundo o CFP

 Nove em cada dez municípios brasileiros têm menos de um psicólogo e psicanalista no SUS a cada mil habitantes. A falta de profissionais restringe o acesso ao atendimento psicológico e ocorre apesar do aumento de transtornos, o que pode agravar o sofrimento mental da população.

O Brasil tem cerca de 439 mil psicólogos, segundo o CFP (Conselho Federal de Psicologia), o que resulta na média de 2 profissionais a cada 1.000 habitantes. Na rede pública, Iaras (SP) e Olaria (MG) são as únicas cidades a alcançar essa taxa.

São 5.050 cidades com cifra abaixo de 1. Os dados apontam que não há registros oficiais da presença de psicólogos na rede pública em pelo menos 400 cidades.

Em nível nacional, a média de psicólogos na rede pública a cada mil habitantes cai para 0,18. Na Inglaterra, cujo sistema público de saúde inspirou o SUS, a taxa é de 0,52, segundo dados de 2023 do Serviço Nacional de Saúde.

As informações são do Instituto República.org, dedicado a aprimorar a gestão de pessoas no serviço público brasileiro, com base em dados de janeiro de 2021 do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde.

A distribuição de Caps (Centros de Atenção Psicossocial) também é baixa nos estados. Dezesseis têm média de centros abaixo da nacional, e sete têm menos de um Caps a cada 100 mil habitantes, segundo dados de 2022 do Ministério da Saúde.

A pasta afirma que aumentou em 27% o orçamento da rede de assistência à saúde mental no SUS em comparação ao ano passado, chegando a R$ 200 milhões. No próximo ano, o investimento será de R$ 414 milhões.

Só os mais ricos tinham acesso a psicólogos quando a profissão foi regulamentada no Brasil, em 1962. Segundo Pedro Paulo Bicalho, presidente do conselho de psicólogos, isso ocorria porque o atendimento em consultório privado era o único modelo de atuação.

“Era uma psicologia elitista, de escutar os problemas de quem podia pagar”, afirma.

A introdução da área às políticas públicas ocorreu ao longo dos anos 1980, com os avanços do movimento antimanicomial. Em 2001, a reforma psiquiátrica mudou a forma de tratar pessoas com transtornos mentais, dando início ao fechamento de hospícios e, mais tarde, levando à criação dos Caps.

A Raps (Rede de Atenção Psicossocial) foi instituída em 2011, englobando os Caps, as UBS (Unidades Básicas de Saúde) e outros pontos de atenção à saúde mental.

Mas o reduzido número de psicólogos persiste por diversos fatores, incluindo remuneração e estrutura profissional, segundo Mariana Rae, coordenadora de projetos do Instituto Cactus, organização dedicada à saúde mental.

Muitas vezes, faltam condições de trabalho, como plano salarial, de carreira e mecanismos para o psicólogo se desenvolver. Esses mecanismos incluem suporte emocional, uma vez que o processo terapêutico é longo e exige uma dedicação extensiva.

“Não é uma coisa pontual, em que uma sessão resolve o problema da pessoa, e isso também diminui a disponibilidade para atender mais gente”, diz Rae.

Hoje, quem deseja uma consulta com psicólogo deve ir a uma UBS relatar seu caso ao clínico geral, responsável pelo encaminhamento.

O número de pessoas que conseguem ser atendidas na psicologia é restrito, devido à alta demanda e ao quadro reduzido de profissionais. Assim, quem tem acesso está, em geral, em um estágio mais avançado do problema.

“A gente espera a pessoa adoecer muito gravemente para começar a oferecer esse serviço, quando precisávamos dar o cuidado enquanto ela ainda tem autonomia e consegue sair de casa”, diz o presidente do CFP.

Mesmo quando o paciente é encaminhado, a fila para ser atendido costuma ser longa. No Rio, por exemplo, o tempo médio de espera para consulta com psicólogo é de três meses e meio, segundo dados deste ano do Sistema de Regulação da cidade.

Larissa Weber é psicóloga em uma clínica do Caps em Guaíba (RS), na região metropolitana de Porto Alegre. Na unidade, a equipe discute sobre a possibilidade de atender quem não foi encaminhado por um médico da UBS e está em estágio menos grave.

Ela diz que o centro oferece atendimento de acordo com o caso, considerando fatores como a rede de apoio e as condições socioeconômicas do paciente.

“Há uma lacuna de pessoas que se beneficiariam de um atendimento psicológico, mas não conseguem ter acesso. O paciente até pergunta: ‘Então tenho que piorar para ser atendido?'”, afirma.

Segundo Larissa, a cidade passou a ter psicólogos em alguns ambulatórios para casos mais brandos, o que pode ampliar o acesso. “Depende do município ter esse entendimento de colocar o psicólogo como prioridade”, diz.

Os Caps cuidam mais dos casos graves, quando a doença afeta a autonomia. Isso inclui, por exemplo, o paciente que não consegue levantar da cama por ter uma depressão severa. Quem sofre com abuso de álcool ou drogas também é atendido.

No centro, o paciente tem acesso a consultas individuais, participa de grupos terapêuticos e é acompanhado por outros profissionais de saúde, incluindo psiquiatras.

Apesar dos benefícios, os Caps ainda são mal distribuídos pelo país, segundo Caroline Ballan, pesquisadora de políticas públicas de saúde mental no Instituto de Estudos Avançados da USP.

A regra é que, em cidades com 20 mil habitantes, deve haver pelo menos um centro de atendimento. Mas, na prática, muitos municípios carecem dessas estruturas.

O quadro se reflete na distribuição dos centros por estado. A média de Caps por 100 mil habitantes em São Paulo (0,99), no Distrito Federal (0,42) e no Rio de Janeiro (0,88) é menor do que a nacional (1,33), segundo dados de 2022 do Ministério da Saúde.

“Estamos muito longe do número ideal, então não temos cobertura. Isso mostra a precariedade do atendimento quando chega na ponta”, afirma Ballan.

Capacitação de profissionais pode ser solução

Em geral, profissionais da UBS são os primeiros a atender pacientes com transtornos. Por isso, os especialistas defendem que uma capacitação sobre saúde mental pode melhorar o acolhimento.

Segundo Mariana Rae, do Instituto Cactus, os agentes comunitários, por exemplo, podem exercer o papel de escuta e facilitar o encaminhamento para os profissionais especializados.

Ela cita o caso do Banco da Amizade, um projeto do Zimbábue que reúne pessoas de comunidades locais para atender pacientes com algum sofrimento mental. Rae diz que a taxa de sucesso é alta, com melhora do quadro de psicopatologias.

“Mas não é uma forma de dizer que a gente não necessita de um especialista. Pelo contrário: ao fazer isso, dedicamos esse profissional para aqueles casos que realmente precisam.”

Em nota, o Ministério da Saúde afirma que o atendimento em saúde mental tem caráter multidisciplinar. Segundo a pasta, a atenção primária realizou 10,9 milhões de atendimentos em saúde mental no primeiro semestre, e 28 Caps foram habilitados. O ministério diz que, embora financie programas, estados e municípios estabelecem suas prioridades.

Conheça locais com menores taxas de psicólogos e de Caps

Cidades com menores cifras de psicólogos por mil habitantes se concentram no Norte e no Nordeste; mais da metade está no Pará

Portel (PA): 0,014

Acará (PA): 0,015

Muaná (PA): 0,016

Monte Alegre (PA): 0,016

Tutóia (MA): 0,018

São Bento do Una (PE): 0,020

Brejo da Madre de Deus (PE): 0,020

São Mateus do Sul (PR): 0,022

Pacajá (PA): 0,022

Nossa Senhora da Glória (PA): 0,024

Caps têm menor concentração em estados do Norte, Sudeste e Centro-Oeste do país; Nordeste lidera a lista com maior número de centros.

Distrito Federal: 0,42

Amapá: 0,57

Amazonas: 0,59

Espírito Santo: 0,8

Acre: 0,88

Rio de Janeiro: 0,97

São Paulo: 0,99

Pará: 1,07

Goiás: 1,12

Mato Grosso do Sul: 1,13

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Fonte: midianews.com.br


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