De janeiro até terça-feira (11), 372 mil ha foram atingidos, área que supera a de duas cidades de São Paulo
O tamanho da devastação causada pelo fogo no Pantanal alcançou um novo patamar alarmante.
De janeiro até esta terça-feira (11), 372 mil hectares foram atingidos por incêndios, área que supera a de duas cidades de São Paulo.
A extensão é 54% maior do que a afetada pelas chamas no mesmo período em 2020 – considerado o pior ano de queimadas no bioma -, quando 241,7 mil hectares queimaram até a data.
Leia também:
Com estiagem no começo, MT lidera ranking nacional de queimadas
Os dados são do Lasa (Laboratório de Aplicação de Satélites Ambientais), do departamento de meteorologia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Até sexta-feira (14), o bioma já teve, em 2024, 2.019 focos de incêndio, segundo a plataforma BD Queimadas, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Em comparação, em 2023, durante o mesmo período, foram 133 focos.
Já em relação a 2020, apesar de a atual área de devastação ser maior, havia focos mais no mesmo período quatro anos atrás, 2.206.
Para especialistas, a situação atual é resultado de seca severa no bioma, que se arrasta pelos últimos anos e foi potencializada pelo fenômeno climático El Niño, e de falta de articulação para ações preventivas contra o fogo.
Os picos de queimadas no bioma costumam ocorrer em setembro.
Assim, com a situação já agravada no primeiro semestre e vinda de um fim de ano com alta de incêndios – em novembro de 2023, foram 4.134 focos de calor, o maior índice já medido pelo Inpe para o período-, a ONG SOS Pantanal encaminhou nesta semana uma nota técnica cobrando ações.
O documento foi endereçado aos governos de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), exigindo um trabalho conjunto mais eficiente e alinhado.
Gustavo Figueirôa, biólogo e porta-voz do SOS Pantanal, destaca que os esforços empregados em pessoal e equipamentos, como aeronaves, ainda não são suficiente para atender a demanda.
À Folha de S.Paulo, ele afirma que os governos “pouco aprenderam” com os episódios anteriores e que um dos principais problemas das queimadas é a falta de prevenção.
“Os governos de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul já assinaram um termo de cooperação com o Ministério do Meio Ambiente este ano para o combate aos incêndios, mas, até agora, a gente não viu a integração”, avalia.
“O Pantanal é um lugar difícil de acesso e a logística é complicada, mas recursos há para isso. Ainda há um número menor [de servidores] do que o necessário para começar a enfrentar esse problema da maneira correta. Precisamos de mais homens, mais equipamentos, helicópteros, aviões, à disposição para fazer esse combate de uma maneira eficaz.”
Na sexta-feira, o Governo Federal criou uma sala de situação para lidar com as queimadas e com a seca, especialmente no Pantanal.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, liderará reuniões a partir da segunda (17) para discutir soluções a simplificação na contratação de brigadistas, equipamentos e aeronaves, entre outras medidas.
O Pantanal, maior planície alagável do mundo, recebe a água das chuvas das regiões de planalto, da bacia do Alto Paraguai.
Numa situação normal, o ciclo das águas começa em outubro, com picos em dezembro e janeiro, se prolongando até março, no máximo. Nas enchentes, as águas transbordam dos rios, conectam lagoas e emendam as imensas áreas alagadas.
Nos últimos anos, a dinâmica não tem funcionado dentro da normalidade.
De acordo com o Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), a bacia do Alto Paraguai, entre os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, acumula déficits de chuva desde o verão de 2019/2020.
Os pesquisadores do órgão apontam ainda que a situação hidrológica atual é considerada crítica no bioma, tendo registrado seca excepcional em algumas áreas, o mais alto grau no ranking de classificação, nas estações pluviométricas de Ladário e Porto Murtinho, ambas em Mato Grosso do Sul.
De acordo com o Serviço Geológico Brasileiro, o rio Paraguai, o principal da região, apresenta os menores níveis históricos.
O Cemaden frisa que a seca afeta as áreas agroprodutivas e que há alta probabilidade de fogo especialmente em Mato Grosso do Sul.
Todo o pantanal está em estado de atenção e alerta, diz a nota.
Figueirôa, do SOS Pantanal, afirma que a maior parte do fogo é causada por ações humanas, sejam intencionais ou não.
As principais vítimas acabam sendo a vegetação nativa e a fauna, como macacos de diversas espécies, cobras, onças-pintadas, ariranhas, cervo-do-pantanal e araras-azuis, que estão ameaçadas de extinção.
Isabelle Bueno, coordenadora de operações do Instituto Homem Pantaneiro, explica que as altas temperaturas e o vento na região neste momento facilitam que o fogo se espalhe.
“O acesso nas áreas do pantanal dificulta um combate direto. Então, existem trabalhos de monitoramento e de proteção das comunidades, das estruturas físicas e das pessoas, mas ainda exige bastante, principalmente, apoio aéreo nesses combates, que é uma dificuldade que a gente tem hoje”, ressalta Bueno.
Em nota, o Ibama diz que está com equipe de brigadistas do Prevfogo atuando principalmente em áreas particulares.
O instituto afirma que foram contratados 157 brigadistas e que uma aeronave faz a avaliação dos maiores focos.
Novas contratações estão previstas, segundo o órgão.
Procurado pela reportagem, o Governo de MS conta que liderou a criação da chamada Lei do Pantanal, em parceria com ONGs e autoridades federais, para conservação do bioma.
A gestão de Eduardo Riedel (PSDB) destaca que mantém ações de prevenção em conjunto com Mato Grosso.
Os bombeiros sul-mato-grossenses, por sua vez, afirmam que instalaram 13 bases avançadas para reduzir o tempo de resposta.
As operações incluem ações na Serra do Amolar e no Parque do Rio Negro, utilizando georreferenciamento, drones e aeronaves.
A corporação diz que os investimentos em aeronaves e tecnologia foram intensificados desde 2020.
Também em nota, o Governo de Mato Grosso afirma que, neste ano, investiu R$ 74,5 milhões no combate ao desmatamento e a incêndios florestais, incluindo locação de aviões, capacitação de brigadistas e ações de fiscalização.
A gestão de Mauro Mendes (União) ressalta que firmou pacto com o Governo Federal e estados da Amazônia Legal.
O Corpo de Bombeiros de MT diz que desenvolveu um plano de prevenção e combate aos incêndios no Parque Estadual Encontro das Águas, em Poconé. A corporação capacitou 50 brigadistas.
Também procurado, o ICMBio não se pronunciou sobre suas ações.
No início do mês, o STF (Supremo Tribunal Federal) determinou que o Congresso deve definir normas específicas para a proteção do pantanal em 18 meses e entendeu que há omissão legislativa.
Se o Congresso não cumprir a determinação, o caso retornará ao STF.
Fonte: diariodecuiaba.com.br