O pecuarista Claudecy Oliveira Lemes, que tem 11 fazendas no município de Barão de Melgaço, em Mato Grosso, é acusado de desmatar parte do Pantanal para plantar capim e fazer pasto para boi. As propriedades dele vão ser administradas por uma empresa escolhida pela justiça até que terminem as investigações sobre esse crime ambiental de proporções gigantescas.
O Fantástico sobrevoou a região afetada: as áreas onde houve desmatamento somam 80 mil hectares – o tamanho da cidade de Campinas, em São Paulo. Os investigadores dizem que a intenção do fazendeiro era aniquilar a vegetação mais alta.
Isso resultou em imensas manchas cinzas na paisagem, formada de árvores que perderam todas as folhas – resultado de um processo chamado de desfolhamento químico, obtido quando se faz uma pulverização criminosa ao lançar de avião toneladas de agrotóxicos sobre a mata preservada. Para conseguir transformar a área em pastagem para gado, o proprietário investiu tempo e fortuna, informa a investigação.
Ele fez a aplicação de herbicidas ao longo de três anos, e as notas fiscais apreendidas revelam que, só com a compra de agrotóxicos, ele gastou R$ 25 milhões. “Quando ele joga diretamente do avião, além de matar essas árvores, influencia também diretamente na fauna, principalmente na água”, disse Jean Carlos Ferreira, fiscal da Secretaria do Meio Ambiente de Mato Grosso que inspecionou a área.
Segundo a Secretaria, o fazendeiro usou 25 agrotóxicos diferentes, um deles tem a substância 2,4-D. O professor Wanderlei Pignati, da Universidade Federal do Mato Grosso, diz que é a mesma presente na composição do chamado agente laranja.
Trata-se de um desfolhante químico altamente tóxico usado pelos Estados Unidos na Guerra do Vietnã. Com o herbicida, as tropas americanas desmatavam florestas pra impedir que soldados inimigos se escondessem embaixo da vegetação. “Ele é bastante estável e é carregado pelo vento a 20, 30 quilômetros longe, vai atingir outras cidades, outros sítios e outras áreas de plantação. Vai muito além do que se imagina”, afirma Pignati.
No Pantanal, peritos comprovaram em laboratório a contaminação em amostras da vegetação, do solo e da água. Os produtos são classificados com potencial de periculosidade ambiental III, ou seja, perigosos ao meio ambiente.
“A gente está falando de uma exposição de risco de saúde mesmo”, diz Rosângela Guarienti Ventura, perita criminal.
R$ 3 BI EM MULTAS
Claudecy Oliveira Lemes, de 52 anos, é um fazendeiro com histórico de crimes ambientais. Ele já é réu em dois processos: tentou alterar o curso natural de um rio e foi flagrado desmatando vegetação nativa em área de especial preservação.
Desde 2019, tem 15 autuações por danos ao meio ambiente no Pantanal. No período em que fazia o desmatamento químico, Claudecy deveria estar recuperando a vegetação em áreas das fazendas – pelo menos era o acordo que tinha assinado com o Ministério Público.
“Alguns crimes são muito nítidos e a gente já pode adiantar: uso e aplicação indevida de agrotóxico; desmatamento de área de proteção ambiental e áreas de preservação permanente; e o crime de poluição em razão da destruição significativa da flora. E isso por várias vezes”, disse Ana Luiza Peterlini, promotora de Justiça. Ainda é impossível ter uma estimativa de quantos anos de cadeia ele pode pegar se for condenado, mas as multas já estão calculadas: somadas, chegam a quase R$ 2 bilhões e 900 milhões.
Claudecy ainda terá que arcar com a reparação dos danos ambientais que causou ao Pantanal: são mais R$ 2 bilhões e 300 milhões para recuperar a vegetação. A polícia quer responsabilizar também o piloto do avião usado para pulverizar o agrotóxico, Nilson Costa Vilela, e o agrônomo Alberto Borges Lemos, que é acusado de fazer a escolha dos produtos desse coquetel de venenos.
Os advogados de Claudecy Oliveira Lemes dizem que ele vem cumprindo o acordo de reposição florestal feito com o Ministério Público de Mato Grosso. O advogado do piloto Nilson Costa Vilela diz que seu cliente aplicou sementes nas fazendas citadas no inquérito, mas nega a acusação de despejo de agrotóxicos para desmatamento químico. O Fantástico não conseguiu contato com o agrônomo Alberto Borges Lemos.
Fonte: ultimahoramt.com.br