MT: FARRA COM DINHEIRO PÚBLICO: MT, centro da “CPI do Sertanejo”, gastou R$ 16,6 milhões com shows

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Levantamento mostra que prefeituras gastaram cerca de R$ 200 por morador com astros do porte de Gusttavo Lima

O cantor Zé Neto, cujo show em Sorriso foi bancado pela Prefeitura, em comemoração ao aniversário da saúde: não houve cobrança de ingressos

Prefeituras de Mato Grosso, o Estado onde há o maior número de investigações do Ministério Público relacionadas à chamada “CPI do Sertanejo”, gastaram pelo menos R$ 16,6 milhões neste ano com a contratação de shows, a grande maioria de cantores do gênero.

O valor é mais que o triplo do que o Estado captou via Lei Rouanet em todo o ano de 2021, não só para financiar projetos de música, mas de todas as áreas da cultura.

Até agora, as administrações municipais contrataram pelo menos 192 apresentações de duplas e cantores do sertanejo em 54 cidades, mais de um terço dos municípios do Mato Grosso.

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O levantamento foi feito pela Folha, com base nos diários oficiais das prefeituras, nos quais estão publicados os cachês dos artistas, e no site do IBGE, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que compila o número de habitantes e dados econômicos de cada município.

Mato Grosso foi onde começou a polêmica dos altos cachês dos sertanejos pagos por prefeituras sem licitação.

Há algumas semanas, Zé Neto, da dupla com Cristiano, criticou a tatuagem anal de Anitta e afirmou nos palcos de Sorriso que não usava a Lei Rouanet, mas omitiu que aquele e tantos outros shows da dupla são bancados com verba pública, isto é, a mesma fonte de recursos da Rouanet.

O Estado da região Centro-Oeste tem 24 investigações ativas do Ministério Público que apuram possíveis irregularidades na contratação dos cantores como Gusttavo Lima.

Entre os municípios investigados estão Sorriso, Brasnorte, Água Boa, São José do Xingú e Canarana.

O procurador-geral de Justiça do Mato Grosso, José Antônio Borges Pereira, escreveu em sua petição que o procedimento visa a “defesa do patrimônio público e da probidade administrativa”.

“Precisamos ver se as prefeituras não estão prejudicando outras políticas públicas que são prioridade, como pessoas passando fome, falta de creches, creches sem merenda, postos de saúde não funcionando. Isso tudo é prioridade em relação a um show, que você pode fazer com cantores locais que cobram menos”, afirmou Pereira, em entrevista por telefone.

Os valores dos cachês, diz ele, são incompatíveis com as capacidades financeiras dos municípios investigados.

Dentre as 54 prefeituras apuradas pela reportagem, a de Cocalinho foi a que mais investiu neste ano, com R$ 1,2 milhão destinados a 15 shows.

É como se cada um dos 5.716 moradores tivesse desembolsado R$ 209 para ver figuras como Maiara & Maraísa, Humberto & Ronaldo e George Henrique & Rodrigo. Lá, quase 40% da população vive com até meio salário mínimo por mês.

A Prefeitura de Cocalinho não respondeu aos questionamentos da reportagem até a publicação deste texto.

O procurador orientou que os promotores de Justiça de cada município apurem a origem do dinheiro usado para custear os cachês. Em sua avaliação, este é um dos pontos chaves da investigação.

Em parte porque pode ter havido desvio de verba —como na cidade mineira de Conceição do Mato Dentro, que pagaria R$ 1,2 milhão a Gusttavo Lima com um dinheiro que só poderia ser destinado à saúde, educação, infraestrutura e ambiente—, mas também porque as apresentações, diz ele, podem ser “showmícios disfarçados” patrocinados por políticos de um ou outro partido.

“Em Mato Grosso, temos 30 cidades com um índice de IDH mais alto, que são os grandes plantadores de soja.

O restante é pobreza e desigualdade pesada. Às vezes a cidade não tem saneamento básico mínimo, mas tem show com cachê milionário”, afirma.

“O gestor público precisa se guiar pelo princípio da eficiência, ou seja, escolher o que é melhor para a população e para o município, e não se autopromover.”

Embora os cantores sertanejos sejam frequentemente associados ao presidente Jair Bolsonaro, a quem já encontraram no Palácio do Planalto na ocasião em que pediram o fim da meia-entrada para shows, não é possível afirmar que tais prefeituras são bolsonaristas.

Em Cocalinho, a campeã de gastos, o prefeito Márcio Aguiar foi eleito por uma coligação do PSB com o PSDB, partidos entre o centro-esquerda e o centro. Em Ribeirãozinho, o prefeito Ronivon Pereira assumiu o cargo pelo PSDB.

Das cinco cidades que mais gastaram, as administrações mais conservadoras estão em Planalto da Serra, nas mãos de uma coligação do Pros com o Patriota —ex-partido de Flávio Bolsonaro—, e de Porto Estrela, do PSC, sigla de direita radical ao qual pertencia o governador afastado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel.

Outra das cidades que mais gastaram por habitante é Novo Santo Antônio, às margens do Rio das Mortes, no Leste do Estado.

Até o início de junho, foram R$ 355 mil empenhados em contratações de shows, como se cada morador desembolsasse R$ 128 para assistir às apresentações.

A maioria delas acontecerá no Festejo de Santo Antônio, celebração do padroeiro da cidade com duração de dez dias, realizada todo mês de junho, este ano com shows do grupo de forró Pisada Quente e dos sertanejos Roby & Roger, entre outros.

A secretária de Administração de Novo Santo Antônio, Maria Aparecida Alves, afirma que o festejo, que deve receber 2.000 pessoas neste fim de semana, gera emprego e renda.

Não há como estimar o quanto de dinheiro é injetado na economia com, diz ela, “mas os quatro hotéis da cidade estão lotados, assim como restaurantes, bares, conveniências e mercados, além do grande movimento de ambulantes vendendo de comida e bebida a bugigangas”.

A secretária afirma ainda considerar injusto avaliar os gastos do festejo sem considerar as demandas do município que a prefeitura tem atendido, como a pavimentação de ruas, a revitalização do cais local e a reforma e ampliação da unidade de saúde, esta ao custo de R$ 800 mil.

A Prefeitura de Planalto da Serra diz que, dos R$ 401 mil empenhados para a contratação de shows, R$ 106 mil vieram da administração municipal, e o restante, da secretaria estadual de Cultura.

A Prefeitura de Porto Estrela afirma que obteve as verbas com a secretaria estadual de Cultura.

A de Ribeirãozinho, outra das cinco que mais gastaram com shows, não respondeu aos questionamentos da reportagem.

 

Fonte: diariodecuiaba.com.br


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