A praça Baquedano, no centro de Santiago, epicentro dos protestos de 2019 no Chile, voltou a viver horas de tensão nesta sexta-feira (17), a dois dias do segundo turno da eleição presidencial. No domingo (19), se enfrentam nas urnas o ultradireitista José Antonio Kast e o esquerdista Gabriel Boric.
A praça, também chamada de Dignidad, foi palco de uma manifestação nesta quinta por causa da morte da viúva do ditador Augusto Pinochet, Lucía Hiriart –ativistas se reuniram para celebrar a notícia e criticar o regime militar (1973-1990). Na madrugada, depois da dispersão, uma intervenção foi feita no local por apoiadores de Kast, que pintaram metade da base de pedra do monumento ao general Baquedano.
Os apoiadores de Kast também levaram grama, plantaram flores e arrumaram a calçada voltada para a parte pintada de branco, enquanto o outro lado ficou com a grama pisoteada e garrafas vazias de espumante do dia anterior. A imagem, na manhã de sexta-feira, era o símbolo de um país dividido entre as duas forças em disputa no domingo.
No fim do dia, antipinochetistas voltaram à praça, vigiada por policiais, e esticaram sobre o pedestal uma faixa com os dizeres: “A direita morreu ontem”. Ainda colaram na parte pintada de branco uma imagem de Kast com uma mancha vermelha na testa, simulando um tiro.
O postulante de ultradireita não comentou a intervenção, mas vários de seus apoiadores o fizeram. O presidente do partido Renovação Nacional, Mario Desbordes, que compõe a aliança que apoia Kast, afirmou que foram militantes de sua legenda que realizaram a ação.
Ele disse: “Ontem na praça Baquedano cantaram e dançaram com um nível de ódio impressionante. Nossos jovens estão em uma posição distinta [da dos manifestantes de esquerda], pretendem mostrar o que queremos para o Chile: um lugar de encontro bonito. Fizeram um esforço enorme de voltar a colocar grama, flores e pintar a base do monumento. Esse é o Chile que queremos”.
Gabriel Boric, em resposta, ironizou os elogios feitos à intervenção. “No nosso governo, trabalharemos para que todas as praças sejam coloridas e floridas, não apenas uma metade”, escreveu nas redes sociais.
A campanha foi intensamente marcada por trocas de farpas entre os dois candidatos, refletindo a polarização do país. Kast venceu a primeira rodada com 28% dos votos, contra 25,6% de Boric. A última pesquisa que pôde ser divulgada sobre as intenções para domingo, do instituto Cadem, mostrava o esquerdista na frente, com 40% da preferência, contra 35% –e mais 25% de indecisos.
Os eventos de encerramento da corrida, realizados nesta quinta, simbolizaram movimentos de ambos no segundo turno: acenos à moderação –uma estratégia para tentar conquistar eleitores de centro e a grande parcela dos que ainda se dizem sem candidato–, mas sem poupar provocações ao respectivo rival.
Boric, em discurso no parque Almagro, disse que está atento a pedidos feitos nos protestos que chacoalharam o país em 2019. “As manifestações estão vivas, pedem respostas e nossa candidatura é a que pode fornecer isso.” Ele cutucou Kast ao afirmar que, diferentemente do oponente, está no ano de 2021, “onde ser contra o casamento igualitário é um retrocesso”.
O ultradireitista, por sua vez, reuniu apoiadores no parque Araucano e também lançou ataques. Disse que o rival não era “má pessoa, mas anda em má companhia e tem más ideias”. Também reforçou a crítica que fez nos últimos debates, de que Boric havia mudado muito sua imagem, em uma estratégia eleitoral, e que isso “é uma falsidade”
Nesta sexta, Gabriel Prieto, 28, eleitor do esquerdista que compareceu à praça Dignidad, disse à reportagem: “Flores, grama e limpeza é o que eles mostram agora como sinal de paz? Que paz é essa, sem dizer onde estão os desaparecidos da ditadura? Sem liberar os presos políticos?”.
Ao redor da praça, carros passavam buzinando, com bandeiras do Chile e de ambos os candidatos.
Fonte: msn.com