Com a decisão do STF sobre o dispositivo, os R$ 19,4 bilhões previstos para emendas do relator em 2023 ficaram sem destino
Escrito por Ingrid Campos, ingrid.campos@svm.com.br
O orçamento secreto perdeu validade jurídica e foi derrubado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na segunda-feira (19). O mecanismo, que dava força maior ao Centrão no Congresso, permitia que recursos da União fossem destinados por parlamentares sem transparência e de acordo com seus próprios interesses.
Com a decisão da Corte, os R$ 19,4 bilhões previstos para emendas do relator em 2023 ficaram sem destino. Agora, parlamentares ligados ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), estudam alternativas para consolidar uma nova forma de manter a gerência sobre esses recursos nas mãos do Legislativo – mesmo que com condições diferentes.
No momento, o rearranjo que se desenha ganha base nas emendas individuais e na PEC de Transição, enviada pela equipe do presidente eleito Lula ainda em novembro para o Congresso com o objetivo de abrir espaços no teto de gastos para financiar políticas públicas essenciais, como o Bolsa Família.
ALTERNATIVAS
Os quase R$ 20 bilhões disponíveis para o orçamento secreto foram divididos em dois (R$ 9,7 bilhões para cada alternativa) com a inconstitucionalidade do mecanismo definida pelo STF.
A primeira metade foi para as emendas individuais impositivas, ou seja, as que têm pagamento obrigatório pelo governo e que permitem a destinação de recursos a projetos específicos, chegando a 2% da Receita Corrente Líquida.
Esse percentual, contudo, foi dividido de forma diferente entre deputados federais e senadores: 1,55% (R$ 32 milhões) do total para o primeiro grupo e 0,45% (R$ 59 milhões) para o segundo. No orçamento deste ano, a partilha acontecia da seguinte forma: cada parlamentar de Brasília, independente da Casa, tinha direito a indicar R$ 17,6 milhões nessa modalidade.
Já a segunda metade diz respeito à PEC da Transição. Agora, o texto autoriza que os R$ 19,4 bilhões em emendas de relator previstos para o próximo ano fiquem, em parte, nas mãos do seu responsável direto no âmbito do extinto orçamento secreto, Marcelo Castro (MDB-PI).
Assim, as emendas disponíveis para os ministérios executarem políticas públicas são acrescidas em R$ 9,85 bilhões em 2023, mas a responsabilidade pelas suas indicações fica com o relator do orçamento, Marcelo Castro. Ou seja, esse valor entra como gasto discricionário do Planalto.
ORÇAMENTO SECRETO E GOVERNO LULA
Desde a campanha, o presidente eleito Lula (PT) tem se mostrado fortemente contrário ao mecanismo, classificando-o como “maior esquema de corrupção da história”. Isso levou a um atrito do então candidato ao Planalto com Arthur Lira, criando um desgaste antes mesmo do envio da PEC da Transição ao Congresso.
Durante a vigência do orçamento secreto, a manutenção do mecanismo, entre outros tópicos, tornou-se condicionante para a aceitação da matéria na Câmara, já que o presidente da Casa gerencia o grupo político mais forte ali, o Centrão. O próprio Lula disse, no início deste mês, que conversaria com Lira se houver “qualquer problema” relacionado ao orçamento secreto.
Com a derrubada, como se mostrou acima, algumas práticas do dispositivo tiveram que ser incorporadas à principal medida do governo de transição, a PEC que suspende o teto de gastos sobre determinados programas do governo.
Todo mundo sabe que penso isso. O presidente Lira sabe que penso isso. E quero dizer para vocês que se tiver qualquer problema, nós vamos conversar. Eu já conversei duas vezes com o Lira, já conversei duas vezes com o presidente Rodrigo Pacheco [do Senado]. E se for preciso conversar 10 vezes, eu conversarei 10 vezes, para que a gente possa fazer aquilo que for melhor para o povo brasileiro no começo do nosso governo. Eu estou muito tranquiloLULApresidente eleito, em fala no começo de dezembro
BANCADA CEARENSE
No ínterim entre a derrubada do orçamento secreto pelo Supremo e a mudança no relatório da PEC da Transição, deputados federais cearenses comentaram, ao Diário do Nordeste, suas percepções sobre o dispositivo.
O deputado federal e vice-presidente estadual do União Brasil, Heitor Freire, posicionou-se contrário ao orçamento secreto, mas não aprovou a definição do Supremo sobre uma questão de outro Poder. Para ele, a Corte “está ultrapassando barreiras há muito tempo, usurpando suas competências e poderes”, mostrando que “não tem respeito” pelo Executivo e o Legislativo.
Fonte: diariodonordeste