Diversos estudos estão indicando um avanço acelerado dos regimes autoritáros ao redor do mundo. Esse autoritarismo não é apenas de direita, como o que vigora na Rússia, na Turquia, em diversos países da África e do Oriente médio, mas também de esquerda como na China, na Venezuela, na Coréia do Norte, na Nicarágua, em Cuba e alguns outros países.
Mesmo com um verniz de democracia, também podemos identificar a eleição de candidatos que professam ideologias de cunho autoritário como o que acabamos de observar no Equador, no Uruguai e na Argentina.
Alguns historiadores sempre gostam de lembrar que a ascensão de Hitler ao poder absoluto na Alemanha aconteceu utilizando das garantias democráticas, depois por ele mesmo abolidas, dando lugar ao regime nazista.
Diversos países da Europa também tem experimentado um avanço de dirigentes que sempre que lhes são oferecidas oportunidades não escondem suas predileções por idéias autoritárias, como na Itália, na Turquia e em diversos outros países. Nota-se, mesmo, um renascimento do facismo e uma apologia por “governos fortes”.
É neste contexto que está iniciando a “corrida” para as eleições americanas que, em 05 de Novembro próximo vão decidir se o Presidente Joe Bidem (Democrata) conseguirá ser reeleito para mais quatro anos como ocupante da Casa Branca ou se haverá o retorno de alguém que representa o Partido Republicano.
Apesar de que sempre existe uma tentativa de surgir algum candidato que represente a chamada terceira via; a realidade americana tem demonstrado que por mais de duzentos anos impera o bipartidarismo e a alternância no poder, isto, desde que a legislação estabeleceu que o máximo que um Presidente pode estar no comando do Poder Executivo é de oito anos (eleição e reeleição).
O processo da escolha aparentemente é bem democrático, pois o sistema eleitoral assenta-se sobre o princípio da consulta aos eleitores filiados em cada partido, as chamadas primárias, que tanto podem ser tipo uma escolha em que todos os filiados ao partido participam, ou então, reuniões menores, os cahamdos “caucus”, ou também as Assembléias menores, as chamadas “Town meeting”, enfim, essas eleições primárias permitem que os candidatos sejam “sabatinados” , questionados sobre vários temas relacionados com a política interna e a política internacional.
Existe, com certeza, um certo “caciquismo” dentro dos partidos, tanto Democrata quanto Republicando, mas não chega ao nível do Brasil em que as convenções e os filiados aos partidos são apenas “massa de manobra”, pois tudo e definido apenas por parte das cúpulas partidárias e pelos “donos” dos partidos.
Aqui nos EUA, não existe uma uniformidade nacional em relação ao processo eleitoral para o país inteiro, sendo que cada Estado tem suas regras próprias, inclusive quanto ao número de delegados, que participarão das convenções partidárias quando, formalmente, será escolhidio o candidato do Partido para concorrer `a eleições presidenciais.
Geralmente o Partido que está no Poder, ou seja, que tem o Presidente existe uma regra informal em que é garantida ao presidente “incumbente” o direito de ser candidato nato, sem precisar submeter-se `as primárias, como deve acontecer com Joe Biden, a quem cabe, após ter seu nome “validado” pela convenção escolher, “livremente” o candidato ou candidata a Vice Presidente.
Assim, neste ano de 2024, apenas no Partido Republicano a escolha do candidato a Presidente deverá ser realizada através das “eleições primárias”, que já teve início no último dia 15, no Estado de Iowa, que colocou em disputa 40 Delegados e no dia 23 deste mes de janeiro será a vez da New Hampshire, onde apenas 22 delegados estão sendo disputados.
No momento existem três pré-candidatos pelo Partido Republicano: o ex-Presidente Donald Trump, a ex Governadora da Carolina do Sul Nikki Haley e o Governador da Florida Ron DeSantis.
Na primária de Iowa Trump consegiu “abocanhar” 51% dos votos e assim ficou com 20 Delegados, e os outros dois candidatos ficaram com o restante. As pesquisas indicam também a vitória de Trump nas primárias de New Hampshire.
Todavia, existem um longo caminho tanto até a convenção, quando, muitas vezes nenhum candidato consegue a maioria dos Delegados nas eleições primárias e aí a decisão, realmente, cabe `a convenção, incluindo os chamados “super delegados”, que representam a cúpula dos partidos, onde estão incluidos governadores e parlamentares de cada partido.
A Convenção do Partido Republicano será de 15 a 18 de Julho e a do Partido Democrata será nos dias 19 e 20 de agosto vindouro, após o que devem acontecer tres debates entre os candidatos a Presidente e um Debate entre os candidatos a Vice Presidente, geralmente, em diferentes partes do país, em universidades, mas com transmissão ao vivo por todos os canais de televisão e diversas plataformas e outros meios de comunicação, proporcionando uma ampla cobertura, facilitando aos eleitores a escolha de quem desejam seja o Presidente pelos próximos quatro anos.
As primárias seguem um calendário longo que vai de 15 de janeiro até 04 de junho, e, no caso do Partido Republicano a Convenção contará com 2.429 delegados eleitores, sendo que para ser homologado candidato são necessários 50% mais um voto, ou seja, 1.215.
Seis Estados tem um peso mais significativo em termos do número de Delegados: Califórnia 169; Texas 161; Flórida 125; Nova York 91; Ohio 79; Carolina do Norte 74.
Outro aspecto interessante é que no dia 05 de Março acontecem primárias simultaneamente em 16 Estados, incluindo Califórnia e Texas, quando, ao todo estarão em disputa nada menos do que 834 delegados, que, somados `as primárias anteriores totalizarão 1.197 Delegados, ou seja, 49,3% do total dos delegados que deverão participar da Convenção Republicana.
Dependendo do número de candidatos, no caso deste ano apenas tres até agora, e se algum passa a ter uma preferência declarada tanto perante os eleitores do Partido (no caso Republicano), muitas vezes a diferença em relação ao número de delegados que cada pré-candidato já tenha conseguido, que nesta fase um franco favorito acaba emergindo e, então, é comum os demais irem desistindo `a medida que as primárias vão se “afunilando” rumo ao final das mesmas.
Apesar de Trump ter sido derrotado há quatro anos, segundo inúmeras pesquisas, se os 91 processos judiciais, inclusive alguns relacionados com a invasão do Congresso (Capitólio) em Janeiro de 2020, considerada uma conspiração e tentativa de abolir a democracia americana, cuja réplica os partidários de Bolsonaro, também que representam a direita e extrema direita, repito, se tais processos não representarem fatores impeditivos do registro da candidatura, tudo leva a crer que Trump deve ser o escolhido pelo Partido Republicano para ser seu candidato na disputa pela Casa Branca.
Diversas pesquisas de opinião pública e de avaliação de desempenho, tem colocado Joe Biden como um dos presidentes com menor avaliação positiva nas últimas décadas, colocando em risco sua reeleição, principalmente devido `as questões da guerra da Rússia contra/invadindo a Ucrania e, principalmente, pelo apoio declarado dos EUA a Israel na guerra, por muitos consideradas um verdadeiro genocídio, contra não apenas o Hamas, mas principalmente contra palestinos, com a morte de mais de 24 mil pessoas, principalmente civis, inclusive mulheres, crianças e idosos.
Boa parte dos eleitores democratas, que, inclusive, votaram em Biden, como os descendentes de árabes e também mulcumanos americanos e afrodescendentes não comungam com a posição do Governo Biden ao apoiar verdadeiras atrocidades de Israel contra os palestinos.
Como Biden venceu a eleições por uma margem de pouco mais de 3%, caso esses eleitores simplesmente deixem de comparecer para votar, com certeza a vitória do candidato republicano, que possivelmente será Donald Trump, poderá ser o vencedor.
Novamente, diversos articulistas, estudiosos e pesquisadores tanto das eleições americanas quanto da dinâmica da geopolítca internacional, tem insistido em afirmar que uma vitória de Trump ensejará um injeção de ânimo nos partidos e ideologia de direita e extrema direita, alguns, inclusive, tem alertado para a elevação do nível de violência política que pode acontecer nessas próximas eleições, em decorrência da radicalização do discurso de Trump, que a cada dia se torna mais agressivo e ameaçador.
Enim, as eleições americanas, longe de serem apenas uma questão de política interna dos Estados Unidos, pela influência e peso geopolítico, geoestratégico e militar que este país exerce no mundo todo, como uma Super Potência, poderá contribuir para o acirramento tanto dos conflitos internos aqui nos EUA quanto o agravamento e ou surgimento de outros conflitos ao redor do mundo, tanto conflitos armados quanto conflitos políticos, ideológicos, econômicos, culturais e religiosos.
Por tudo isso, vale a pena também ficarmos de olho nessas eleições gerais americanas, além, é claro, em nossas eleições municipais brasileiras, que, também, tudo leva a crer, estarão sendo polorizadas e nacionalizadas, radicalizadas entre a extrema direita bolsonarista e de outro lado, o PT, outros partidos de esquerda ou até mesmo alguns partidos mais de centro que fazem parte da base de sustentação do Governo Lula.
De mesma forma que as “mid term elections” (as eleições para alguns governadores, deputados e senadores de meio de mandato do Presidente incumbente) aqui nos EUA, servem de termômetro para aas eleições presidenciais dois anos depois; também as eleições de prefeitos ai no Brasil, principalmente para as cidades e municípios com mais de 200 mil ou 300 mil eleitores em 2024 será um prenúncio do que poderá acontecer em 2026, quando os eleitores deverão escolher um novo presidente ou reeleger o atual (Lula).
Quem viver, verá!
Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, Sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista e articulador da Pastoral da Ecologia Integral. Email profjuacy@yahoo.com.br