O transplante proporciona qualidade de vida a 134 pessoas do Estado que passaram a enxergar melhor
Para o auxiliar de produção que mora em Várzea Grande, Jocinei Alexandre da Silva, 35 anos, a cirurgia de transplante de córnea simbolizou a realização de um sonho. Ele perdeu a visão do olho esquerdo aos 7 anos de idade e passou pelo procedimento em julho deste ano pelo Sistema Único de Saúde (SUS), em Cuiabá.
“Agora parece que eu vejo o mundo de uma forma mais colorida, aberta e mais clara. Foi um marco histórico na minha vida. A realização de um sonho mesmo, onde eu tive o privilégio e a honra de voltar a enxergar com o olho esquerdo. Estou feliz e grato pela família do doador que autorizou a doação e proporcionou a mim a recuperação da vista”, destacou Jocinei.
A cirurgia de transplante de córnea é novidade para o mecânico que reside em Vila Rica, Evandro Mota dos Santos, de 29 anos. Ele perdeu a visão do olho direito em dezembro de 2021, após um acidente de trabalho em que uma faísca quente atingiu os seus olhos. Surpreso com a possibilidade de voltar a enxergar, o vila-riquense contou que nunca tinha ouvido falar do transplante de córnea.
“Eu nunca tinha ouvido falar que isso era possível, mas para minha surpresa a cirurgia existe e eu consegui fazê-la. A minha nota para a cirurgia é 10 porque ela é complicada e foi de sucesso. Agradeço a Central Estadual de Transplante por mediar esse trabalho que é muito importante para toda a população”, avaliou Evandro.
Evandro e Jocinei estão entre os 134 pacientes que receberam córneas doadas em 2023 e fazem o acompanhamento pós cirurgia no Hospital dos Olhos, Instituro da Visão (Visionare) e/ou Centro Cuiabano de Excelência em Oftalmologia (Visão), unidades habilitadas e contratualizadas pela SES para o transplante no estado.
O secretário de Estado de Saúde, Gilberto Figueiredo, aproveitou a última semana do Setembro Verde, campanha nacional que busca incentivar a doação de órgãos e tecidos no país, para ressaltar que o número de córneas doadas evidencia a grandiosidade do SUS no processo de salvar vidas.
“Vemos a importância do SUS desde o trabalho dos profissionais na sensibilização da família do potencial doador, até a conclusão do processo de doação. A SES investe na qualificação dos profissionais desta área, para que outras pessoas tenham a chance de sobreviver através de um gesto tão nobre como a doação”, disse o secretário.
Doação de órgãos
De janeiro a agosto deste ano, foram realizadas seis captações de órgãos em Mato Grosso. As doações beneficiaram 39 pacientes de Mato Grosso, São Paulo, Pernambuco, do Acre, Paraná e Distrito Federal. Apesar do número ser celebrado no Estado, a secretária ajunta de Regulação da SES, Fabiana Bardi, pontua que a recusa da família em fazer a doação e a mistificação da morte são aspectos que ainda desafiam o SUS.
“Trabalhamos diuturnamente para desmistificar a temática. Entendemos a importância do diálogo nesse processo, por isso estamos investindo na criação das Comissões Intra-Hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplantes dentro dos hospitais públicos e privados do Estado. Essas comissões são responsáveis pela entrevista familiar e pelas orientações quanto ao processo de doação”, afirmou a secretária.
Conforme explicou a coordenadora da Central Estadual de Transplante da SES, Anita Ricarda da Silva, existem dois tipos de doadores: o vivo e o já falecido, sendo este último realizado somente com a autorização da família, etapa que causa morosidade à doação e, consequentemente, ao transplante.
“Por isso, é imprescindível a sensibilização de toda a sociedade sobre o assunto. Uma rede de apoio estruturada e uma família sensível à causa permite vida nova para outras pessoas que sofrem a angustia da espera”, acrescentou Anita.
Os doadores falecidos são pacientes com morte encefálica, geralmente vítimas de lesões cerebrais, como traumatismos cranianos ou AVC (derrame cerebral). O falecido pode doar coração, pulmões, fígado, pâncreas, intestino, rins, córneas – que são tecidos –, veias, ossos e tendões.
A coordenadora da Central Estadual de Transplante destacou que o doador precisa manifestar ainda em vida, para a família, o desejo de ser doador.
Já o doador vivo pode ser qualquer pessoa saudável que concorde com a doação. O doador vivo pode doar parte da medula óssea – que é tecido –, parte do rim, parte do fígado e parte do pulmão. Pela lei, parentes até quarto grau e cônjuges podem ser doadores. Não parentes podem doar somente com autorização judicial.
O único cadastro de doadores existente no Brasil é o Registro de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome), realizado nos hemocentros públicos. Pessoas com mais de 18 anos podem se cadastrar como doadores voluntários de medula óssea na sede do MT Hemocentro, em Cuiabá.
Transplante
O Brasil é referência mundial em transplantes e possui o maior sistema público de transplantes do mundo. Atualmente, cerca de 96% dos procedimentos do país são financiados pelo SUS.
Em números absolutos, o Brasil é o 2º maior transplantador do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Os pacientes recebem assistência integral e gratuita, incluindo exames preparatórios, cirurgias, acompanhamento e medicamentos pós-transplante, pela Rede Pública de Saúde.
Em Mato Grosso, são realizados os transplantes de córneas e tecidos. Os pacientes que precisam de transplante de outros órgãos são encaminhados pelo serviço de Tratamento Fora Domicílio para serem transplantados em outros Estados; os gastos com locomoção e a ajuda de custo para estadia e alimentação do paciente e acompanhante são pagos pela SES-MT.
O serviço de transplante de rim em Mato Grosso passa por uma reestruturação das unidades de referência. No momento, o Governo está em tratativas para retomar integralmente os serviços.