Enchentes na Eslovênia, incêndios florestais na Itália e Grécia e calor extremo na Espanha. A União Europeia (UE) vive um verão de extremos.
Em meio às ruas cinzentas do bairro que abriga as instituições da UE em Bruxelas, o Centro de Coordenação de Reações de Emergência (ERCC) do bloco trabalha 24 horas por dia, sete dias por semana, na conexão dos serviços nacionais de emergência, coordenação do envio de equipes e equipamentos de resgate, assim como na tentativa de prever novas catástrofes naturais.
Nesta segunda-feira (07/08) o comissário europeu de gerenciamento de crises, Janez Lenarcic, anunciou após as enchentes na Eslovênia que a Alemanha e a França enviariam pontes pré-fabricadas, equipamento de escavação e equipes de engenheiros. Ao mesmo tempo, a Grécia enviava aviões de combate para ajudar no combate aos incêndios florestais no Chipre.
No final da semana passada, Lenarcic, informou que nove países europeus eram monitorados em razão de risco extremo de incêndios, enquanto cinco outras nações recebiam alertas de enchentes e duas outras estavam em alerta vermelho para altas temperaturas ou chuvas.
Tais operações estão em alta no momento. Em 2018, o centro europeu atendeu 20 pedidos de ajuda. Em 2022, o total de pedido decuplicou, chegando a mais de 230. Por trás desse aumento estão fatores como a pandemia de covid-19, a guerra na Ucrânia e, cada vez mais, os desastres naturais.
Como funciona a proteção civil europeia
Lenarcic supervisiona o Mecanismo de Proteção Civil do bloco europeu, uma entidade voltada para o gerenciamento de crises estabelecida em 2001, no intuito de ajudar os países a unir os recursos para emergências e fortalecer as capacidades mútuas de combate aos desastres, sejam estes naturais ou causados pelo homem.
Tão logo os países europeus estejam perante uma situação de emergência, eles podem enviar um alerta e ativar o mecanismo de crise, detalhando o equipamento e a expertise que necessitam. Assim, outras nações podem enviar ofertas de ajuda, com Bruxelas encarregada pela coordenação, centralização e facilitação do envio de recursos financeiros.
Todos os 27 Estados-membros, juntamente com outros nove países que incluem a Turquia, Ucrânia e Noruega podem contribuir, sendo que nações mais distantes também podem enviar pedidos de ajuda.
Este ano, o Canadá requisitou a ajuda de bombeiros europeus para o combate a incêndios florestais. Em 2022, equipes de especialistas em purificação da água e médicos foram enviados ao Paquistão, enquanto o país lidava com enchentes devastadoras.
Estoques de equipamentos
A pandemia de covid-19 serviu como um alerta para a União Europeia. Os governos se viram em meio a uma escassez de ventiladores e máscaras, e despreparados para estabelecer centros de testagem em massa ou lidar com hospitais superlotados.
A suspensão do tráfego aéreo e o fechamento das fronteiras fez com que muitos dos meios tradicionais da Europa para receber equipamentos e medicamentos, especialmente vindos da China, fossem bloqueados ou se tornassem mais lentos.
Para evitar que isso venha a se repetir, em 2020 Bruxelas passou a armazenar uma quantidade maior de equipamentos médicos para os países da UE.
Atualmente, o bloco possui recursos que vão desde kits médicos de proteção a hospitais de campo prontos para serem enviados. Os estoques, abrigados em múltiplas locações, também incluem helicópteros, aviões de combate a incêndios, barracões e geradores de energia.
Após a invasão russa da Ucrânia, em fevereiro de 2022, Bruxelas acelerou os esforços para armazenar equipamentos de descontaminação e pílulas de iodo para o caso de um desastre químico ou nuclear.
Aviões de combate a incêndios
Mas, a lista de equipamentos prioritários para os estoques de emergência vem aumentando e se torna cada vez mais difícil de ser atendida, enquanto os efeitos do aquecimento global ficam cada vez mais perceptíveis em todo o continente.
O Centro Comum de Pesquisas da UE avalia que os incêndios florestais devastaram em torno de 260 mil hectares de terras no continente em 2023 e causaram danos ambientais e econômicos de enormes proporções.
Levando em conta as previsões de que as chamas devem continuar a gerar grandes estragos nos países do bloco nos próximos anos, Bruxelas planeja adquirir 12 novos aviões de combate a incêndios para uma inédita frota dessas aeronaves, através do financiamento central da UE.
Mas, esses aviões não estarão disponíveis tão cedo. “Criar nossa própria frota é algo que leva tempo, uma vez que a produção global de alguns tipos dessas aeronaves foi paralisada”, explicou a porta-voz da Comissão Europeia Miriam Garcia Ferrer no mês passado.
“O mercado tem ofertas limitadas de novos aviões anfíbios de combate a incêndios, que são os que precisamos para lidar com o grave problema que enfrentamos.”
Garcia Ferrer diz que, segundo os planos atuais, as aeronaves devem entrar em ação somente em 2027.
Os limites da cooperação
Lenarcic vem fazendo elogios à colaboração entre as equipes de emergência do bloco, mas a solidariedade entre elas possui alguns limites. Isso porque o mecanismo de proteção civil da UE é apenas voluntário.
Os Estados-membros podem optar por ajudar ou não os países em necessidade, o que normalmente ocorre, mas não são obrigados a fazê-los. O bloco não possui poderes legais para tornar as decisões referente às catástrofes naturais. É necessária a aprovação dos países do bloco para que as reservas dos recursos de emergência possam ser utilizadas.
Para modificar isso seria necessário reeditar alguns dos tratados da fundação do bloco europeu, algo com o qual alguns governos costumam ser reticentes, temendo ceder poderes adicionais a Bruxelas.
No ano passado, Lenarcic sugeriu que a UE deveria rever essa configuração. “Por um lado, temos esse tratado. Por outro, temos uma sensação cada vez maior de que a Europa precisa de proteção civil”, observou.
“Quando e se houver uma decisão de modificar esse tratado, estou seguro que um tema fará parte das discussões: como reforçar a reação às catástrofes, incluindo a capacidade de tomada de decisões em nível europeu, algo que não possuímos até o momento”, afirmou.
Europa Central sofre efeitos do clima extremo
O clima extremo vem castigando a Europa Central nos últimos meses, durante o verão no hemisfério norte. A região vem sendo atingida por diversos desastres naturais, que já causaram ao menos seis mortes.
Na Eslovênia, dois terços do território da pequena nação de 2,1 milhões de habitantes foram afetados por fortes enchentes, na maior catástrofe natural ocorrida desde a independência do país, em 1991.
Os Corpos de Bombeiros eslovenos realizaram 57 operações somente na noite de domingo. Desde a sexta-feira, chuvas incessantes fizeram com que os rios Sava, Drava e Mura e diversos lagos trasbordassem.
Enchentes e deslizamentos de terra fizeram com que vários vilarejos tivesse de ser evacuados, com estradas e ferrovias submergidas. Na Áustria, algumas regiões anda estão sob risco de deslizamentos,
O primeiro-ministro esloveno, Robert Golob, exaltou o fato de seu país não estar isolado em um momento de extrema necessidade. “Nesse momento difícil, a Eslovênia não está só”, escreveu. “Temos muitos amigos e apoio internacional, incluindo da UE, Otan e dos Estados Unidos.”
A Eslovênia – Estado-membro da Otan e da UE – acionou o mecanismo de reação a catástrofes do bloco europeu, o que resultou no envio das pontes pré-fabricadas por parte da Alemanha e de escavadeiras da França. Berlim deve enviar também 700 milhões de euros em ajuda.
Uma equipe avançada da Agência Alemâ de Apoio Técnico (THW) se encamihava para a Eslovênia nesta segunda-feira. “Vemos com profunda tristeza as terríveis enchentes na Eslovênia e na Áustria”, escreveu em seu perfil no Twitter o chanceler federal alemão, Olaf Scholz. “Nossos pensamentos estão com as vítimas, familiares e todos os que perderam suas casas.”
Na Croácia, foi declarado estado de emergência em várias partes do país., enquanto estradas, plantações e vilarejos sofriam com inundações.
Entretanto, nos três países a situação deve apresentar melhoras, com a previsão de uma diminuição no nível das águas.
Fonte: dw.com