A cidade portuária ucraniana de Odessa enfrentou nesta quinta-feira (20/07) a terceira noite seguida de bombardeios, os mais severos desde fevereiro de 2022, após a Rússia se retirar do acordo que garantia a exportação de grãos da Ucrânia pela rota do Mar Negro.
Ao menos três pessoas morreram e um prédio do consulado chinês foi parcialmente danificado, segundo informações das autoridades ucranianas. Em Mikolaiv, outra cidade portuária ucraniana, outras 19 pessoas teriam sido feridas, entre elas uma criança.
A Crimeia, território ucraniano sob ocupação russa, também registrou ataques consecutivos desde a segunda-feira, conforme oficiais russos – primeiro uma ponte, depois um depósito militar e, na quarta, uma adolescente teria morrido após um drone atingir quatro prédios públicos.
Após o Kremlin anunciar que trataria embarcações rumando para portos ucranianos a partir das 0h de quinta-feira (horário de Moscou) como potenciais alvos militares e partes do conflito, Kiev devolveu a ameaça nos mesmos termos, direcionando-a navios rumando para a Rússia e portos ocupados no Mar Negro.
Porta-voz da Casa Branca, Adam Hodge sugeriu que o anúncio poderia ser um pretexto da Rússia para atacar navios civis e culpar a Ucrânia, e alega que há novas minas do Kremlin nas imediações dos portos ucranianos.
Em meio à escala de tensão, o preço do trigo registrou na quarta aumento de 8,2% nos mercados europeus e do milho, 5,4%. Nos Estados Unidos, o mercado futuro de negociação de trigo também teve alta de 8,5% – a maior desde a invasão em larga escala da Ucrânia, em fevereiro de 2022, embora ainda muito abaixo do recorde registrado em maio do ano passado.
Alta nos preços deve ser sentida pelo consumidor final só nos próximos meses
Embora a movimentação nas bolsas de valores na Europa e nos Estados Unidos não se traduza em uma alta de preços imediata para o consumidor final, o impacto deve ser sentido nos próximos meses porque o fim do acordo afeta as cadeias de suprimento globais e pressiona os preços.
Foi assim no ano passado, quando a guerra na Ucrânia fez subir não só o preço dos grãos, mas também da carne.
Segundo o Ministério das Relações Exteriores alemão, a cada um ponto percentual de aumento nos preços de alimentos, um milhão de pessoas são empurradas para a pobreza absoluta.
Carlos Mera, chefe de mercados de commodities da agricultura no Rabobank, disse à agência de notícias Associated Press que os preços do trigo subiram 17% ao longo da semana passada, mesmo antes dos eventos no Mar Negro – algo que ele atribuiu a “um pouquinho de pânico” entre investidores.
Segundo Mera, uma parcela dos grãos exportados pela Ucrânia é destinada a países pobres, em regiões como o Norte da África, por exemplo, onde a população local já sofre com a insegurança alimentar e altos preços. Já a Rússia teria exportado quantidades recordes de trigo nos últimos meses.
Mais de 60.000 toneladas de grãos destruídos, segundo Kiev
Alegando o descumprimento de garantias em benefício de exportações russas de alimentos e fertilizantes e o desvirtuamento do corredor de grãos para fins militares, a Rússia se retirou na segunda-feira do acordo que mantinha desde julho do ano passado com a Ucrânia e lançou, em retaliação pela explosão de uma ponte na Crimeia, uma série de bombardeios contra a infraestrutura portuária do país.
A ação teria destruído mais de 60.000 toneladas de grãos, segundo Kiev, e organizações internacionais e países do Ocidente afirmaram que terá repercussão sobre a segurança alimentar global, atingindo sobremaneira os mais pobres.
Previsão de baixa nos estoques globais de trigo
Durante a vigência do acordo, a Ucrânia exportou 32,9 milhões de toneladas de bens agrícolas, dos quais 16,9 milhões de toneladas de milho e 8,9 milhões de toneladas de trigo – antes, esses números oscilavam, respectivamente, entre 25-30 milhões de toneladas/ano e 16-21 milhões de toneladas/ano.
Segundo previsões do Departamento de Agricultura norte-americano, os estoques globais de milho atingirão até o final da temporada 2023/24 o maior nível em cinco anos, mas os estoques de trigo estarão no nível mais baixo em oito anos.
Índia bane exportações de arroz
Responsável por 40% das exportações globais de arroz, a Índia anunciou nesta quinta a suspensão imediata da venda de arroz ao exterior – exceto do tipo basmati.
À agência de notícias Reuters, o presidente da Associação de Exportadores de Arroz na Índia disse que o veto impactaria muito mais rapidamente o mercado global de arroz do que o que aconteceu com o trigo por causa da Guerra na Ucrânia.
Quase 90% da produção de arroz vem da Ásia, região que sob os efeitos do El Niño tende a receber menos chuvas – o cultivo do arroz requer muita água.
A decisão do governo indiano foi justificada como necessária para assegurar o abastecimento do mercado interno e controlar preços, que subiram 3% em um mês após chuvas intensas levarem à perda de safra.
O banimento se soma ao veto à exportação de trigo. De olho nas eleições, a serem realizadas em maio de 2024, o governo indiano já havia restringido as exportações de arroz e açúcar antes.
O arroz é considerado um alimento essencial para mais de 3 bilhões de pessoas ao redor do globo, e os preços já estão no patamar mais alto dos últimos 11 anos.
ra (AP, Reuters, ots)
Fonte: dw.com