Quedas nos preços dos combustíveis, do carro novo, e de alimentos como carne e leite levaram o país a registrar em junho a primeira deflação de 2023.
O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) teve queda de 0,08% no mês passado, em relação a maio, divulgou o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) nesta terça-feira (11/7).
Essa foi a menor variação para o mês de junho desde 2017, quando o índice foi uma deflação de 0,23%
O resultado ficou praticamente em linha com a expectativa dos economistas, que era de uma queda de 0,09% para o IPCA em junho, segundo a mediana das expectativas colhidas pelo boletim Focus do Banco Central.
Com o resultado, a inflação acumulada em 12 meses caiu de 3,94% em maio para 3,16% em junho, menor patamar desde setembro de 2020
A deflação em junho fortalece a expectativa de que o Banco Central deve começar a cortar a taxa básica de juros a partir de agosto, avaliam economistas.
O cenário de desinflação também representa um alívio para as famílias, combinado a um momento de renda em alta, fruto de um mercado de trabalho ainda aquecido e benefícios sociais ampliados.
Mas o IPCA em terreno negativo deve ter vida curta, e a expectativa é de que a inflação volte a crescer a partir de agosto, com a taxa em 12 meses encerrando o ano pouco abaixo dos 5%.
Entenda nesta reportagem:
- Por que a inflação caiu em junho pela primeira vez no ano;
- O que esperar para os preços de produtos e serviços nos próximos meses;
- E qual o efeito da desinflação para o futuro da economia.
Por que a inflação caiu em junho
Entre os principais destaques da queda da inflação em junho está um recuo de 1,85% dos combustíveis, com quedas do óleo diesel (-6,68%), do etanol (-5,11%), do gás veicular (-2,77%) e da gasolina (-1,14%).
A variação negativa reflete corte de preços anunciado pela Petrobras em junho – foi o segundo corte feito pela empresa, desde que a estatal comunicou a mudança da sua política de preços, em meados de maio.
Com a mudança, a Petrobras abandonou o chamado PPI (preço de paridade de importação), que desde 2016 atrelava o valor dos combustíveis no mercado interno à variação do petróleo no exterior e do câmbio, passando a considerar outros fatores na formação de preços.
De acordo com o MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços), foram comercializados no período 125 mil carros com descontos entre R$ 2 mil e R$ 8 mil.
Com isso, os preços do automóvel novo caíram 2,76% no IPCA de junho, conforme o IBGE, e os dos usados recuaram 0,93%.
Outro destaque no mês foi a alimentação no domicílio (-1,07%), com quedas nos preços do óleo de soja (-8,96%), frutas (-3,38%), leite longa vida (-2,68%) e carnes (-2,10%).
Vilãs da inflação nos últimos anos, as carnes já acumulam queda de preços de 5,89% em 2023.
“Há um aumento de oferta [de animais para abate nos frigoríficos e carne nos açougues] e também insumos mais baratos, com soja e milho [usados na ração animal] caindo bastante”, acrescenta Andréa Angelo, analista de inflação na gestora de investimentos Warren Rena.
Na ponta positiva, as maiores altas foram registradas no grupo de habitação (0,69%), devido a reajustes de energia elétrica e água e esgoto em algumas capitais.
O grupo de saúde e cuidados pessoais (0,11%) foi influenciado pela alta nos preços dos planos de saúde (0,38%), decorrente do reajuste de até 9,63% autorizado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em 13 de junho.
Em transporte, o destaque foi a alta de 10,96% das passagens aéreas em junho, após queda de 17,73% em maio.
O que esperar para a inflação nos próximos meses
Embora a inflação tenha dado folga em junho, o alívio deve durar pouco e a expectativa dos economistas é de que o IPCA volte a registrar variações positivas de agosto até o fim do ano.
Em julho, o resultado ainda deve ser próximo de zero, ou até mesmo ligeiramente negativo, preveem os economistas da Ativa e da Warren Rena, devido a uma combinação de fatores.
Neste mês, passa a valer a reoneração total do PIS/Cofins para a gasolina e o etanol, após corte de impostos feito pelo governo Jair Bolsonaro (PL) às vésperas da eleição de 2022 e mantido pela gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nos primeiros meses de governo.
No entanto, o efeito da reoneração foi parcialmente compensado por mais um corte de preços de combustíveis da Petrobras, de R$ 0,14 por litro da gasolina, que entrou em vigor em 1º de julho.
A partir de agosto, esse efeito pontual sobre as contas de luz desaparece e a queda no preço dos alimentos deve perder força. Com isso, o IPCA deve voltar ao campo positivo de agosto a dezembro.
A taxa acumulada em 12 meses, que chegou a 3,16% em junho, também deve voltar a crescer até o fim do ano, prevê Sanchez, da Ativa.
Isso porque, com o passar dos meses, irão saindo desta conta as deflações registradas em julho (-0,68%), agosto (-0,36%) e setembro (-0,29%) de 2022 – quando o país registrou uma rara sequência de três meses de quedas do IPCA, sob o impacto do corte de impostos da gasolina, aprovado por Bolsonaro em meio à sua tentativa frustrada de reeleição.
“Vamos observar esse trimestre deflacionário [de julho a setembro de 2022] saindo da média móvel”, diz Sanchez. “Então não é que a inflação mensal vá explodir, mas há uma normalização.”
Qual o efeito da deflação para o futuro da economia
Embora a deflação não deva persistir nos resultados mensais do IPCA nos próximos meses, o resultado negativo de junho deve contribuir para que o Banco Central inicie o corte da taxa básica de juros a partir de agosto, avaliam os economistas.
“Isso aos poucos vai ajudar o crédito a ficar mais barato e é isso que chega na ponta para o consumidor”, completa a economista.
Quando os juros caem, isso barateia o crédito para o consumo das famílias e investimento das empresas, contribuindo para um maior dinamismo da atividade econômica – é por isso que o nível de juros se tornou um “cavalo de batalha” entre BC e governo Lula nos últimos meses.
Além disso, a perda de força da inflação representa um alívio para o orçamento das famílias, que veem seu poder de compra menos pressionado pela alta de preços.
Também é um fator positivo para o governo, que se beneficia de uma percepção melhor da população com relação à economia. Não à toa, a queda de preços aos consumidores tem sido comemorada por Lula nas redes sociais.
Sanchez observa, porém, que o processo de desinflação ainda ocorre de forma mais vagarosa do que o ideal.
No acumulado de 12 meses, o IPCA foi de 10% em 2021, para 5,90% em 2022 e a expectativa do mercado agora é de que chegue a 4,95% em 2023.
A meta de inflação é de 3,25% este ano, mas, com a margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos, ela chega a 4,75% em seu limite superior.
Assim, a expectativa dos analistas é de que o afrouxamento monetário deverá ser feito pelo BC em ritmo lento.
Sanchez espera um corte de 0,25 ponto percentual em agosto e, depois sucessivos cortes de 0,50 ponto, levando a Selic dos atuais 13,25% para 12% ao fim deste ano e 9% em 2023.
Fonte: bbc.com