Chegada ao Brasil em 1993, a Marcha para Jesus, um evento que congrega diferentes igrejas cristãs, acontece nesta quinta-feira (8/6), em São Paulo, pelo 31º ano consecutivo.
Há três décadas, a primeira edição acontecia na mesma cidade. Um grupo de 350 mil pessoas partiu da Avenida Paulista, passando pela Avenida Brigadeiro Luís Antônio e chegando ao Vale do Anhangabaú para adoração de Jesus Cristo e comunhão por meio de músicas.
Já em 2022, a estimativa dos organizadores mostra que o público cresceu exponencialmente: dois milhões de pessoas participaram do ato na mesma cidade, um aumento de 471%.
“A avaliação do crescimento é simples: o crescimento desse grupo tem continuado ao longo dos anos, o Brasil já tem 70 milhões de evangélicos”, diz o historiador e antropólogo Juliano Spyer, autor de O Povo de Deus: Quem são os evangélicos e por que eles importam (Geração Editorial, 2020).
O cálculo de Spyer tem como base uma pesquisa Datafolha de 2019 que aponta que 31,8% da população brasileira (composta por 214,3 milhões de pessoas) são adeptas à religião
A Marcha foi criada por um grupo de líderes religiosos, incluindo o pastor Roger Forster, da Ichthus Christian Fellowship, o cantor e compositor Graham Kendrick, e Gerald Coates e Lynn Green, participantes de movimentos cristãos.
Em 1990, a Marcha já tinha alcançado 49 cidades em todo o Reino Unido, além de Belfast, capital da Irlanda do Norte, onde 6 mil católicos e protestantes se reuniram. A estimativa era de que cerca de 200 mil religiosos participassem do evento. A Marcha rapidamente se expandiu para outros continentes.
No Brasil, a Marcha para Jesus foi oficialmente incorporada ao calendário em 2009, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em seu segundo mandato, sancionou a Lei Federal 12.025.
De acordo com o apóstolo Estevam Hernandes, presidente do evento no Brasil, a Marcha representa a união das pessoas, a comunhão de todos que acreditam em Jesus Cristo. “Ele é o nosso resgatador, pois deu sua vida por nós na cruz. Saímos às ruas para marcar e honrar essa entrega, expressando nossa fé”, explica.
Ele defende que a Marcha “se transformou no evento cristão mais importante do Brasil e até da América Latina e tem abençoado a vida de pessoas de várias gerações ao longo dos anos”.
“A Marcha cresceu muito e se consolidou, não só pela quantidade de pessoas, mas pela constância. Nos últimos 30 anos, realizamos o mesmo evento com o mesmo empenho e propósito. Hoje temos cerca de 2 milhões de pessoas participando do evento, com um número grande de denominações e também de cristãos em geral.”
Para a edição de 2023, além da abertura da Marcha Para Jesus em São Paulo, no dia 8 de junho, outros oito municípios devem receber o evento até o mês de outubro
Embora o evento tenha como público principal os cristãos evangélicos, Spyer aponta que o grupo é descentralizado.
“Às vezes falamos como um tema só, mas não são exatamente como os católicos, que têm uma igreja, um papa. Dentro das milhões de igrejas evangélicas, há diferentes práticas, tradições e regras. Vão desde igrejas mais conservadoras do ponto de vista de costumes até as ultraliberais, que abraçam, por exemplo, a comunidade LGBT.”
Em resposta à BBC News Brasil, Hernandes afirma que um aumento na diversidade e participação de denominações cristãs foi notado, além de um “reconhecimento internacional, como referência em termos de manifestação de fé.”
A influência política dos evangélicos
Spyer aponta que o tamanho da Marcha Para Jesus hoje no Brasil é apenas uma das representações de força dos brasileiros evangélicos, que, para ele, representam o fenômeno social mais importante do país atualmente.
O antropólogo diz que os evangélicos são ignorados por determinados grupos da sociedade — menciona “surpreendente falta de interesse e desconhecimento da elite brasileira e econômica e cultural sobre o tema”. Apesar disso, diz que eles conhecem sua força — em especial, influência política — no país.
“Converso com evangélicos de vários lugares do Brasil e o que percebo é que ganharam consciência [como comunidade]. Eles dizem: ‘A política é um mal necessário e, se não escolhermos, alguém vai escolher por nós’
Spyer lembra que, em 2022, Jair Bolsonaro (PL), derrotado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no segundo turno, conquistou mais que o dobro dos votos de evangélicos em relação ao adversário — mas avalia que o cenário não deve se repetir.
“Lula é o último presidente a ser aceito sem o apoio majoritário desta população, porque ela é crescente e deve representar uma parcela ainda mais decisiva na próxima eleição. No âmbito do legislativo, isso já aconteceu há muito tempo. A bancada dos evangélicos é o exemplo, e a comunidade religiosa tem consciência disso.”
Ao longo dos anos, políticos da direita e da esquerda têm participado do evento. Em 2022, Bolsonaro, então presidente, discursou em Curitiba, no Paraná.
Neste ano, Lula recusou o convite, avaliado por ele como “honroso”, e afirmando que será representado pela deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) e pelo ministro-chefe da Advocacia-Geral da União, Jorge Messias.
“Sempre admirei e respeitei a Marcha para Jesus, que considero uma das mais extraordinárias expressões da fé de nosso povo”, disse em carta ao apóstolo Estevam Hernandes.
Hernandes disse que a organização do evento convida as autoridades constituídas, como prefeito, governador e presidente da República. “O intuito é incluir e abençoar pessoas que trabalham diretamente com o destino do município, do estado e do país”, afirma Hernandes.
Fonte: bbc.com