CGU derruba sigilo de 100 anos de processo de Pazuello

CGU derruba sigilo de 100 anos de processo de Pazuello
Compartilhar

 

 

Exército terá 10 dias para liberar na íntegra procedimento disciplinar que analisou a participação do ex-ministro da Saúde em um ato político ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro quando era general da ativa.

A Controladoria-Geral da União (CGU) determinou nesta sexta-feira (17/02) que o Exército Brasileiro libere na íntegra o procedimento disciplinar que analisou a participação do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello em um ato político ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro, em 2021. O Comando do Exército terá dez dias para cumprir a decisão.

Durante o governo Bolsonaro, havia sido imposto um sigilo de 100 anos ao processo, com a alegação de que ele continha “informações pessoais” – o que contrariava determinações anteriores da CGU.

De acordo com a decisão da Controladoria desta sexta-feira, a liberação deverá ser do “inteiro teor” dos documentos, “com o tarjamento, estritamente, de informações pessoais e dados biográficos inerentes a aspectos da vida privada do titular constantes nos autos”.

O parecer da CGU veio após a conclusão, nesta sexta-feira, da análise do primeiro grupo de recursos dos 234 que estão sendo revisados quanto à manutenção de sigilos impostos a informações públicas durante o governo Bolsonaro. Os pareceres são referentes a 22 processos, que envolvem cinco temas diferentes – o procedimento disciplinar de Pazuello era alvo de 18 recursos.

Participação em ato político

Em junho de 2021, o jornal O Globo noticiou que o Exército Brasileiro negou acesso e atribuiu um sigilo de 100 anos ao processo sobre a participação de Pazuello, na época general da ativa, num ato político ao lado de Bolsonaro.

Em resposta a um pedido de acesso feito pelo jornal, o Exército respondeu que o processo administrativo, já arquivado, continha informações pessoais. Além disso, a instituição citou um dispositivo da Lei de Acesso à Informação que prevê o sigilo por 100 anos em casos do tipo. A decisão, no entanto, ignorava entendimentos anteriores da Controladoria-Geral da União (CGU).

Pazuello participou no dia 23 de maio de uma manifestação no Rio de Janeiro convocada por apoiadores de Bolsonaro, que contou com uma motociata liderada pelo então presidente. O ex-ministro subiu num carro de som ao lado de Bolsonaro, apesar de as Forças Armadas vetarem a participação dos seus membros em atos políticos.

Dias depois, o Exército informou, no entanto, que não iria punir Pazuello pela participação no ato. Segundo a instituição, o comandante do Exército, Paulo Sergio Nogueira, acolheu os argumentos de Pazuello e avaliou que “não restou caracterizada a prática de transgressão disciplinar” por parte de Pazuello. Dessa forma, o processo disciplinar aberto contra o general em maio acabou sendo arquivado.

A avaliação entra em choque com o decreto nº 4.346/02, que aborda o Regulamento Disciplinar do Exército. Mais especificamente, as ações de Pazuello contrariaram o item 57 do Anexo I, que classifica como transgressão o ato de “manifestar-se, publicamente, o militar da ativa, sem que esteja autorizado, a respeito de assuntos de natureza político-partidária”.

Na defesa entregue ao Exército no fim de maio, Pazuello argumentou que o ato organizado por Bolsonaro não era político. Segundo o general, o ato não poderia ser “político-partidário” porque o país não estava em período eleitoral e Bolsonaro não era, na época, filiado a nenhum partido político. Pazuello também afirmou que o ato não passou de um passeio de moto, embora tanto ele quanto Bolsonaro tenham subido num caminhão de som para falar a apoiadores, como se estivessem em um comício.

A decisão ignorava determinações anteriores da CGU, que, em casos similares, considerou que os procedimentos administrativos devem ficar sob sigilo somente enquanto a apuração está em andamento, o que não se aplica ao processo contra Pazuello.

Pedido de Lula

A decisão envolvendo o procedimento de Pazuello ocorreu após um pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em janeiro, para que houvesse a revisão do sigilo de documentos federais.

“A partir do despacho do presidente da República foi determinado que fizéssemos revisão e reanálise de casos envolvendo sigilo com base em fundamentos questionáveis, no sentido de banalizar o sigilo e prejudicar a política de transparência pública”, disse o ministro da CGU, Vinícius de Carvalho, na época.

Dos 234 casos, 111 apresentaram como justificativa para o sigilo o fato de envolverem segurança nacional; 35, questões de segurança do presidente da República ou de seus familiares; 49, informações consideradas pessoais; e 16 eram relativos à proteção das atividades de inteligência – além de 23 com sigilo por “outros motivos”.

Retrocessos

De acordo com a CGU, durante o governo de Jair Bolsonaro foram registrados 511.994 pedidos de acesso a informações através da Lei de Acesso à Informação. Desses, 64.571 foram negados total ou parcialmente.

Entre os negados, apenas 2.510 foram objeto de recurso para a CGU, o equivalente a menos de 5%. Entre esses pedidos negados que foram alvo de recurso, 1.335 receberam uma nova negativa – e é entre estes que estão os processos que agora estão sendo revisados.

Segundo Carvalho, a revisão ocorre porque “nos últimos anos testemunhamos alguns retrocessos importantes em relação ao acesso à informação e a toda política de transparência de um governo aberto”.

Tendo por base o material sob análise, ele avalia que o governo anterior acabou por “utilizar determinadas categorias para ampliar os sigilos, de forma a dificultar acesso à informação”. Como exemplo dessas categorias, o ministro mencionou as de segurança nacional e de proteção de dados pessoais, usadas em situações em que elas não se enquadram.

A derrubada de sigilos foi uma das bandeiras de Lula durante a campanha eleitoral. A determinação pela transparência de gastos federais já resultou na divulgação, em 12 de janeiro, de gastos com o cartão corporativo dos ex-presidentes da República entre 2003 e 2022, abrangendo os dois mandatos anteriores de Lula (2003-2010), os de Dilma Rousseff (2011-2016), de Michel Temer (2016-2018) e de Jair Bolsonaro (2019-2022).

Os dados revelaram que Bolsonaro gastou pelo menos R$ 27,6 milhões com os cartões corporativos ao longo de quatro anos. No topo das despesas estão valores desembolsados com hospedagens: foram R$ 13,6 milhões no total, muitas vezes em hotéis de luxo, em contraste com o discurso de “homem simples” que Bolsonaro tentou adotar ao longo do seu mandato. Um hotel de luxo do Guarujá, no litoral paulista, recebeu R$ 1,46 milhão da Presidência ao longo de quatro anos.

Fonte:  dw.com


Compartilhar
0 0
Happy
Happy
0 %
Sad
Sad
0 %
Excited
Excited
0 %
Sleepy
Sleepy
0 %
Angry
Angry
0 %
Surprise
Surprise
0 %