JUACY DA SILVA
“Eu sou a ressurreição e a vida, aquela que crê em mim, ainda que morra viverá” (Palavras de Jesus Cristo, conforme o Evangelho de São João, Capitulo 11:25)
“Humanidade de cima, estamos em sintonia, venha nos auxiliar, na luta de todo dia! A morte não é o fim, vocês já estiveram aqui; amanhã estaremos aí. a vida continua, sim! Humanidade do Espaço, as barreiras se rompem. é tempo de união! Hoje já não é ontem, aceite o nosso abraco, através desta canção! Humanidade de Cima, estamos em sintonia, venha nos auxiliar na luta de todo dia! (trecho da Canção Legionária Humanidade de Cima”.
O dia era 20 de Novembro de 2021, só que era um sábado, não um domingo, como hoje em novembro de 2022. Até mesmo a temperatura era mais amena, durante o dia em torno de 8 graus centigrados, enquanto nesta madrugada foi de 4 graus abaixo de zero e a máxima será de apenas um grau Celsius positivo.
Havíamos chegado nos EUA, no Aeroporto Internacional de Dulles, na Virgínia há apenas dois dias, depois de mais de dois anos termos estado “presos” em Cuiabá, devido a pandemia da COVID-19, praticamente reclusos em casa, longe das filhas, dos netos e neta, a quem tanto amamos e sempre estivemos por perto, mesmo residindo tão distantes.
Afife, que há pelo menos 5 anos desenvolvia demência vascular, sempre, boa parte do tempo estimulada como por exemplo nas chamadas de videos que nossas filhas sempre faziam, lembrava ainda relativamente bem das pessoas com as quais convivia mais proximamente e continuava com boa independência e autonomia.
Sofremos muito com a distância e as saudades das filhas, netos e neta e mais ainda com o pavor que o avanço da covid-19 fazia no Brasil e no resto do mundo, o noticiário diário era bem macabro, só noticias e imagens de mortes, sepultamentos, gente entubada e sofrendo nos hospitais e vendo, por diversas vezes a morte bem de perto com a despedida de parentes, amigas e amigos que foram tragados por esta terrível pandemia.
Assim, só depois de vacinarmos com três doses e submetermos aos testes exigidos pelas autoridades de todos os países, inclusive dos EUA e do Brasil, decidimos viajar rumo a esta região, nos EUA, com muitas saudades, expectativas e ansiedade, pois o medo do contágio ainda estava presente principalmente para pessoas idosas, como a gente.
Saímos de Cuiabá no dia 10 de novembro, uma quarta feira bem quente, em um voo da tarde, direto para o Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, para uma parada, evitando que a viagem fosse tão cansativa, onde permanecemos por uma semana, quando, como sempre fazíamos em Cuiabá, caminhávamos diariamente, de mãos dadas, na certeza de um apoio mútuo, tanto emocional quanto físico, o que sempre chamou a atenção de pessoas, muitas que nem ao menos nos conheciam e nos paravam para conversar e, logo, vinha a pergunta “quantos anos vocês tem de casados”.
Com certa alegria, entusiasmo e em tom as vezes jocoso, Afife devolvia a pergunta “advinha quantos anos”, e as pessoas diziam uns 30 ou 40 anos; e ai ora eu ora ela dizíamos 50, 51 ou nos últimos dias de nossa vida em Cuiabá, 52 anos. Geralmente as pessoas admiravam e falavam “Que Deus abençoe coces sempre”, pois elas admiravam a nossa vitalidade física e companheirismo diário.
Outro aspecto interessante, Afife adorava ouvir o canto dos pássaros, tanto em casa quanto ao caminharmos pelas ruas de Cuiabá, principalmente das araras que migraram em bandos para Cuiabá, fugindo das queimadas que dizimaram boa parte do maravilhoso Pantanal Mato-grossense e também os bem-te-vis, que ela volta e meia parava para imita-los e observa-los. Essas são cenas que permanecem bem vivas em minha mente e lembranças.
Afife também adorava plantas, sempre que via uma planta falava, “a gente podia conseguir muda desta planta e levar para casa”, onde, em Cuiabá sempre cultivamos o verde incluindo na frente da casa duas grandes árvores de primavera, um pé de acerola, pés de mamão e também hortaliças, que Afife gostava tanto de regar, cuidar e admirar o crescimento, as flores e os frutos.
Saímos de Cuiabá, estávamos alegres, felizes pois iriamos passar em torno de quatro a cinco meses nos EUA, só voltaríamos após o aniversario de Afife, que seria em 27 de Março de 2021, chegamos até a planejar uma viagem da área de Washington, DC para Nova York, como fizemos há uns dez anos passadas, só Afife e Eu, quando por uma semana comemoramos um aniversario dela naquela cidade maravilhosa.
Em nossos planos também estava uma viagem para a Itália, Roma, para ficarmos uns meses com Ludmila, nossa filha caçula e o nosso netinho, Ollie, que moravam ainda naquela época em Bruxelas e que iria ser transferida para Roma. O que acabou não acontecendo.
No Rio, durante quase uma semana de 11 a 17 de novembro todos os dias caminhávamos, as vezes pelo calçadão de Copacabana ou pela areia a beira mar, sempre em torno de 5 a 6 km diários, as vezes pela manhã e as vezes ao entardecer e em alguns dias em ambos os períodos, estendendo a distância percorrida, mas que Afife conseguia fazer sem grande desgaste físico.
Antes de sairmos de Cuiabá, fizemos, como sempre fazíamos e eu continuo fazendo, anualmente, um “check up” completo, para ver se não pudesse surgir algum problema de saúde na viagem ou quando aqui chegássemos.
Afife tinha alguns problemas de saúde, mas todos plenamente controlados e estava bem de saúde, incluindo o controle da hipertensão arterial, a degeneração ocular húmida e a osteoporose, ela não tinha colesterol elevado, nem diabetes, ao longo dos últimos 20 anos sempre tomamos regularmente as vacinas recomendadas, inclusive para gripe, pneumonia e graças a esses e outros cuidados recomendados possamos ilesos durante a pandemia do coronavírus.
Enfim, sabendo que estávamos bem de saúde e que nenhuma risco imediato poderia surgir, decidimos fazer mais uma vez, talvez a vigésima longa viagem entre o Brasil e os EUA, bem cansativa, mas que nos trazia alegria e felicidade por poderemos desfrutar de mais uns meses de convívio com nossas filhas, netos e neta, como fizemos ao longo dos últimos 30 anos, desde que, ao retornarmos ao Brasil no inicio dos anos noventa, nossas filhas, então ainda jovens decidiram aqui ficar e acabaram constituindo famílias, adentraram o mercado de trabalha e se tornaram cidadãs americanas, por naturalização.
A viagem do Rio até os EUA, foi , como sempre é, bem longa, um voo saindo do Galeão de madrugada, amanhecendo na cidade do Panamá e chegando na Virgina logo depois de meio dia do dia 18 de novembro de 2021, em um contraste enorme de temperatura,pois ao deixarmos o Rio de Janeiro, onde na década de oitenta moramos por dez anos, onde nossas filhas passaram boa parte da infância e adolescência, repito, ao sairmos do Rio a temperatura estava quase 40 graus centigrados e ao aqui chegarmos estava na faixa dos dez graus.
No restante daquele dia descansamos bastante, mas logo no dia seguinte, 19 de de novembro, uma sexta feira, lá estávamos nós, Afife e Eu, de mãos dadas, fazendo nossa caminhada pela trilhas e em meio `as florestas urbanas que adornam muito esta região, que cujas árvores, diferentes do que ocorre este ano, ainda estavam com bastante folhas, de um colorido maravilhoso, como acontece durante o outono nos EUA, principalmente nesta região metropolitana de Washington, DC, Distrito de Columbia, capital do país.
No sábado, dia 20 de novembro seria mais um dia como outro qualquer, caminhamos pela manhã, conversamos por telefone Sophia, Raphael, Nick, Phil, Mark, nossos netos, Valéria e Ludmila, esta última, que, mesmo morando na Europa estava por aqui. Havíamos combinado para almoçarmos juntos em um restaurante no dia seguinte, domingo, quando toda a família estaria reunida.
Após o almoço, fomos a uma loja que também é supermercado, a Wall Mart, comprar algumas coisas e já estávamos na expectativa das comemorações do “thanksgiving” que seria na semana seguinte e também do Natal, que ocorre um mês após essas festividades do “Dia de ação de gracas”.
Ao retornar para casa, por volta das cinco da tarde, Afife queixou-se de cansaço e disse que não iria jantar, apenas tomou um yogurt e depois um copo de leite, deixando a missa para o dia seguinte, que seria domingo pela manhã , na Igreja de Santa Verônica, aqui bem perto de onde ‘moramos”, costumamos ficar com Verônica e Mathew, quando estamos nos EUA.
Ao longo de minha vida já estudei bastante e escrevi vários artigos sobre saúde, doença e mortalidade, mas, pessoalmente, nunca havia visto uma pessoa morrer na minha presença, na minha frente. Sei, como sempre soube, ao comparecer a velórios de pessoas amigas e de vários familiares meus ou de Afife, o quão triste e complicada é a morte, na verdade um grande mistério.
Ver uma pessoa em uma urna urna funerária ou ver um enterro é uma experiência triste e dolorosa, mas ver uma pessoa morrendo na frente da gente e algo mais triste e cruel ainda do que a gente imagina, mesmo que tentemos prolongar a vida, isto foge totalmente ao nosso controle.
Assim foi com Afife, ela subiu para o andar superior da casa onde fica nosso quarto, sentou-se na cama rezou/orou, como costumava fazer todas as noites ao longa da vida, antes de dormir, fez o sinal da cruz e deitou-se, pedindo que eu a cobrisse e deitou-se, dizendo que estava com frio, ai eu coloquei mais um cobertor.
Na mesa de cabeceira estava sua caneca de água, sua companheira inseparável, pois muitas vezes acordava a noite e costuma beber água e as vezes ir ao banheiro. Mas naquela noite foi totalmente diferente, como ela não quis jantar eu ia descer para preparar minha comida, mas antes que eu deixasse o quarto ela sentou-se na cama extremamente pálida e foi logo dizendo “ Juacy, eu vou morrer, chame um médico, chame um médico”, levei o maior choque pela palidez em que ela estava e gritei para Verônica que estava no quarto em frente, e ela chamou o 911, um número universal aqui nos EUA que ao ser chamado aciona um sistema de emergência de pronta respontas.
Em menos de quinze minutos duas ambulâncias, com suas equipes e aparelhos chegaram em casa, mas antes de chegar passaram orientações para Verônica, minha filha, quanto a alguns procedimentos que deveriam ser feitos até que as equipes de Socorro chegassem.
Graças ao apoio de Matthew, nosso neto mais velho que estava em casa e de Verônica, eles deitaram Afife no chão do quarto e realizaram os procedimentos de reanimação. Chegando as equipes esses procedimentos, com a ajuda de vários aparelhos foi tentada da reanimação, as vezes ela dava sinal de ‘voltar”, mas aos poucos foi desfalecendo até que a morte tomasse conta de sua vida e de seu corpo.
Sei que o espírito, a alma não permanece em um corpo inerte e assim estava alí, bem em nossa frente Affie aquela pessoa admirável,maravilhosa, cheia de vida , de coragem, que gerou nossas três filhas, que jamais titubeou em enfrentar e vencer todos os desafios desde sua infância, juventude e idade adulta, inerte, sem poder dar suas gargalhadas, fazer suas piadas, conversar, rezar.
Como aqui nos EUA não existe o que no Brasil é o IML, todas as pessoas que morrem em casa, são levadas a um hospital imediatamente após o falecimento, para os exames de praxe e definir a causa da morte.
Afife foi levada para um hospital bem próximo no inicio da noite daquela sábado, 20 de novembro de 2021; onde ficou até no dia seguinte. Telefonei para Valéria e Ludmila, dando a mais triste notícia que podia falar em toda a minha vida.
Várias pessoas da família e Eu, estivemos no hospital por horas até que a equipe médica concluísse os trabalhos de diagnóstico da causa da morte, quando, então foi possível iniciarmos o que seria o velório, que só terminaria 40 dias depois, em uma funerária em Cuiabá.
Enquanto ela estava no Hospital, foi possível contemplar seu rosto sereno,lindo, como se ainda estivesse viva e apenas dormindo, lembro bem que naqueles momentos foram meus últimos abraços e beijos em seu corpo inerte, frio, sem qualquer reação.
Como desejei que aquela situação fosse apenas um sonho ou um pesadelo e que logo, ao acordar, tudo seria diferente. Mas não era nem sonho e nem pesado, apenas a realidade do final da etapa de uma vida terrena, cuja alma/espirito se desprende da matéria e volta `as suas origens, a Deus, `a eternidade, `a transcedência que, como cristãos, por acreditarmos na ressureição, um dia poderemos nos encontrar novamente, em outra realidade que transcende toda a materialidade e continua sendo, talvez, `a semelhança de quando a vida é gerada, um dos maiores mistérios que acompanha o ser humano desde tempos imemoriais. O inicio e o fim da vida são os dois grandes e indecifráveis da curta ou longa existência humana.
Foi alí no hospital que nos despedimos de Afife, era noite, talvez a noite mais longa, angustiante e triste de nossas vidas, por sabermos que ao amanhecer do domingo, que foi um dia ensolarado, lindo não teriamos mais a presença de nossa querida Afife que por tantos e tantos anos esteve conosco nas alegrias e tristezas, nos mo,mentos felizes e em outros mais desafiadores.
Logo cedo no domingo, fomos a uma funerária acertar os trámites e próximos passos para o translado de Afife para o Brasil, que, conforme o desejo dela, não desejava ser cremada ou sepultada fora do Brasil, queria que sua última morada terrena fosse ao lado de seus pais e demais parentes no Cemitério de Várzea Grande, em Mato Grosso. E assim, fizemos.
Não me lembro bem, mas acho que foi na segunda ou terca feira após o falecimento que Ludmila, Phil, Mark e Nick foram `a funerária onde seu corpo, congelado, embalsamado estava “guardado”, para se despedirem de Afife. Eu não fui, estava muito angustiado e como iriamos promover o translado eu teria oportunidades de despedir-me e ver Afiffe pela última vez quando do velório e sepultamento em Mato Grosso.
Jamais poderiamos imaginar o quão longo , dificil e complicados seria o processo de translado de uma pessoa de um país para outro e mais complexo por estarmos ainda, naquela ocasião vivendo tanto nos EUA quanto no Brasil e diversas outros países o que poderiamos chamar de “rescaldo” da covid-19.
As exigências e a documentação foram imensas e somente depois de 39 dias conseguimos que Afife pudesse ser velada por poucas horas em Cuiabá e sepultada no Cemitário São Francisco, em Várzea Grande.
Entre a morte e o sepultamente dela, vários acontecimentos se transcorreram, desde as dificuldades do translado e também as “comemorações” do “thanksgiving” e Natal, que, confesso, não nos davam alegria como em tantas outras ocasiões ao longo de mais de 50 anos de vida em comum.
No domingo, dia seguinte `a morte de Afife, como já estava programado e reserva feita, fomos almoçar em um restaurante, havia sido feita uma reserve para 13 pessoas, só que um lugar ficou vazio, era o lugar de Afife. Nem precisa dizer que a comida não tinha gosto, a única coisa que povoava nossas mentes e alimentava as nossas conversas era a morte de Afiffe.
O mesmo aconteceu com as reuniões do Thanksgiving (Dia de Ação de Graças) e Natal ,sem graça e bem triste, pelo menos para mim e nossas filhas, netos e neta. Mas aos poucos a “ficha ia caindo” e a gente ia percebendo que por mais triste e dolorosa que fosse esta situação, era de fato uma realidade concreta e cruel, sem retorno.
Antes, porém, na sexta feira, dia 26 de Novembro, por iniciativa de nossa amiga de mais de 30 anos Neusa Medeiros, uma pessoa extremamente religiosa e companheira de caminhada aqui nos EUA, foi encomendada uma missa de Sétimo Dia, celebrada por um padre, cujo nome não consigo lembrar, na capelinha da “Missionhusrt”, nas proximidades da Marymount University, uma universidade católica na Virgínia, onde nossas tres filhas estudaram, onde, por tantas vezes Afife esteve frequentando missas e rezando.
Terminado o Natal e com todos os trâmites burocráticos resolvidos, no dia 26 de dezembro de 2021 embarcamos, minha filha Valéria e Eu, para o Brasil em um voo com destino ao Rio de Janeiro, com escala em Miami. Esta era a primeiro vez que, ao longo de mais de 30 anos, eu estava voltando ao Brasil sozinho, sem Afife.
Chegamos ao Rio e no dia seguinte, quando estavamos para embarcar para Cuiabá o voo que estava trazendo Afife para sua última morada no Brasil, saiu dos EUA com destino a SP e de lá para Cuiabá.
Assim, no dia 29 de dezembro de 2021, Afife estava, finalmente, sendo velada em Cuiabá, com a presença de algumas pessoas de nossas famílias, alguns amigos e amigas. Na capela onde ela estava sendo velada foi rezada uma missa de corpo presente pelo nosso amigo de longa data, conselheiro espiritual, o nosso querido Padre Deusdédit, Vigário Geral da Arquidiocese de Cuiabá.
Concluído o sepultamento, logo nos dias seguintes ocorreram as celebrações do final de ano e almoço do dia 01 de Janeiro de 2022, no salão de festas do edifício onde mora minha cunhada Arlete, pessoa maravilhosa que me tem dado muito apoio, como Ivete, sua irmão e demais parentes de Afife.
Durante o almoço eu estava tossindo muito e minha filha Valéria insistia para que eu fizesse o teste para covid-19, no que eu dizia que era renite alérgica que me acompanha há longos anos. Pela insistência dela fiz o teste na segunda feira e logo depois, no mesmo dia veio o diagnóstico positivo, eu estava com covid.
Isto acendeu o alerta vermelho, minha filha deveria retornar aos EUA para “tocar” sua vida e se contraísse a doença teria que ficar de quarentena no Brasil por mais algumas semanas até que testasse negativo e pudesse viajar.
Depois de 4 ou 5 dias, Valéria testou negativo, apesar de estar convivendo comigo e retornou ao Rio, para logo depois voltar aos EUA e eu fiquei sozinho, apenas com a companhia da Celeste, nossa boa escudeira, que não mediu sacrifícios para estar me ajudando nos cuidados enquanto eu estive com a covid-19, até em um dia em que por não estar passando bem tarde da noite precisei ir ao pronto atendimento da unimed e ela foi comigo.
Naqueles momentos, confesso que, como centenas de milhares de pessoas já haviam morrido ou estava internadas ou entubadas em hospitais eu também corria este risco, mas continuei confiante de que minha hora não havia chegado, como de fato não chegou até este momento.
Minha vida ao longo desses doze meses, desde que Afife nos deixou e foi para sua morada eterna, não tem sido fácil, por mais que eu me esforce, lute a dor interior apenas refece um pouco, pois as lembranças estão presentes 24 horas por dia.
Ao caminhar seja em Cuiabá, no Rio de Janeiro ou aqui nos EUA, todos os lugares, as ruas, as trilhas, as paisagens, as fotos que retratam um pouco dos momentos felizes ou tristes, que, como todas as famílias percorrem ao longo de suas caminhadas continuam bem presentes.
Assim, com apoio, palavras amáveis, muita compreensão e carinho de parentes, amigas e amigos sigo nesta trajetória, o que pode ser a última etapa desta caminhada por este planeta. Sei que aos 80 anos, tenho muito mais passado do que futuro, mas o tempo que mesma desta vida terrena quero vive-la promovendo o bem e buscando contribuir para um mundo melhor. Assim fazendo, sei que estarei honrando a memória de Afife, uma mulher amorosa, determinada, corajosa, lutadora e, acima de tudo, extremamente religiosa, cristã e “muito família”, que não media esforços ou sacrifício para estar junto a quem sempre dela necessitava.
Este é apenas o resumo, um pedacinho deste primeiro ano sem a presença física de Afife entre nós, pois sua presença espiritual continua bem constante e podemos senti-la a cada momento. Hoje, em Cuiabá e aqui nos EUA, Afife estará sendo lembrada em missas, quando podemos rezar presencial ou espiritual e emocionalmente pela sua alma tão generosa!
Afife Bussiki da Silva, primeira mulher que empreendeu em Mato Grosso, ao estabelecer e operar um laboratório de Análises Clínicas, em Cuiabá, uma das primeiros, segunda ou terceira mulher a dirigir e a ter um carro na capital do Estado, antes de haver SUS costumava realizar exames laboratoriais gratuitamente a quem não tinha recursos financeiros para faze-los; Católica fiel, praticante, voluntária na organização da Caritas Arquidiocesana de Cuiabá, esposa dedicada, parceira de tantas jornadas, mãe amorosa, irmã e filha generosa e sempre presente na vida da família, ao deixar este planeta sempre será lembrada por tantas coisas boas que fez para tanta gente!
Juacy da Silva, Gaitherburg, MD 20 de Novembro de 2022