Fernanda Torres diz que impunidade permite que fantasmas da ditadura retornem

Fernanda Torres diz que impunidade permite que fantasmas da ditadura retornem
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Na pré-estreia em Nova York, a atriz situou para a audiência local o significado da anistia para crimes de estado durante a ditadura militar brasileira.

Nova York foi palco de uma exibição histórica nesta segunda-feira (13), com a estreia do filme Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles e estrelado por Fernanda Torres. A obra, que retrata a luta de Eunice Paiva após o desaparecimento forçado de seu marido, Rubens Paiva, durante a ditadura militar brasileira, trouxe à tona discussões urgentes sobre memória, justiça e democracia. Num teatro completamente lotado, Fernanda e Walter responderam a perguntas do público, enfatizando a necessidade de responsabilização pelos crimes cometidos durante o regime.

O acordo silencioso e os fantasmas do passado

Fernanda Torres, que venceu o Globo de Ouro na semana passada e aguarda uma possível indicação ao Oscar, explicou ao público estrangeiro as particularidades da transição brasileira para a democracia. “No Brasil, a ditadura durou 21 anos. E quando os militares decidiram que era hora de terminar, eles ainda estavam no comando”, apontou, segundo relato de Jamil Chade no UOL. A atriz comparou a situação ao caso argentino, onde a ditadura militar, apesar de extremamente violenta, foi encerrada após apenas seis anos, com o colapso dos militares na guerra das Malvinas. Esse contexto permitiu que a sociedade civil processasse os responsáveis pelos crimes do regime.

“No Brasil, houve um acordo: nós [os militares] perdoamos vocês, e vocês esquecem o que aconteceu durante a ditadura. Mas esse fantasma vem à tona novamente e tenta ganhar vida”, afirmou Fernanda, destacando como a recente tentativa de golpe durante o governo Bolsonaro reflete a persistência dessas forças na política brasileira.

A importância do filme no debate público

Ainda Estou Aqui tem sido um catalisador para a discussão sobre os crimes da ditadura. O filme foi citado pelo ministro Flavio Dino como inspiração para a reavaliação da Lei de Anistia de 1979, com destaque para casos de desaparecimentos forçados, como o de Rubens Paiva. “É muito impressionante que a Suprema Corte utilize o filme para dizer: ‘espere um minuto, desaparecimento forçado é um crime contínuo e não pode ser parte da anistia’”, afirmou Fernanda.

Walter Salles reforçou a posição do filme como instrumento de justiça. “Estamos ao lado de Eunice. Os crimes da ditadura precisam ser julgados e punidos, como ocorreu na Argentina e no Chile. É por isso que golpes continuam acontecendo no Brasil: porque os responsáveis nunca foram julgados”, declarou o diretor.

A janela de oportunidade e o futuro da democracia

Fernanda acredita que o momento atual foi crucial para o lançamento do filme. “Se tivéssemos concluído este filme há quatro anos, durante o governo de Jair Bolsonaro, ele provavelmente não teria sido lançado. Tivemos uma janela. Foi possível por existir o sentimento de que a democracia poderia ser salva”, refletiu.

Para a atriz, o filme não apenas recupera memórias dolorosas, mas também gera empatia e humanidade. “Talvez este filme ajude no futuro, no próximo momento de nossa democracia”, disse. Ela destacou a força simbólica de uma cena em que Eunice Paiva exige que seus filhos sorriam para uma foto destinada a uma revista. “Ela usou o sorriso como arma, uma forma de dizer que não estava quebrada.”

Walter Salles acrescentou que, à medida que o Brasil caminhava para a extrema direita, o sentimento de urgência no filme se intensificou. “Percebemos que não era apenas sobre o passado, mas sobre quem somos hoje”, afirmou.

Reflexo de esperança

Ainda Estou Aqui tem sido recebido como um marco cinematográfico e político, mostrando que, para garantir um futuro democrático, é essencial confrontar os traumas do passado. “Hoje, todos odeiam todos. Mas Eunice nos ensina que a gentileza, o sorriso, pode ser mais poderoso do que a agressividade”, concluiu Fernanda Torres.

O filme estreia nos cinemas dos EUA nesta sexta-feira, prometendo ampliar o debate sobre justiça de transição e o papel do cinema na reconstrução da memória histórica.

Fonte:  www.brasilcultura.com.br


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